Título: 'Meta de superávit é a mais difícil desde 99'
Autor: Lu Aiko Otta
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/04/2006, Economia & Negócios, p. B8

Para consultor, alvo só será atingido com contingenciamento de R$ 19 bi

Com a aceleração dos gastos públicos no primeiro bimestre, 2006 será o ano mais difícil para se cumprir a meta de superávit fiscal primário (exclui juros)desde 1999, quando a atual política de grandes superávits foi iniciada. A meta de 2006 é de 4,25% do PIB. A análise é do economista e consultor Alexandre Marinis, da Mosaico Economia Política. "Eu acho que o governo vai entregar a meta, mas a dificuldade será a maior até hoje", diz.

Segundo Marinis, o superávit acumulado em 12 meses deve cair abaixo de 4,25% entre o fim do primeiro semestre e o início do segundo, e o governo deverá fazer um contingenciamento recorde de gastos de mais de R$ 19 bilhões, se de fato quiser cumprir a meta.

A razão básica para as dificuldades é que o desempenho fiscal do primeiro bimestre, em relação à meta estabelecida, foi o pior já realizado desde 1999, diz o economista. Nos dois primeiros meses do ano, o governo realizou apenas 8,7% da meta total de superávit do ano, comparado com uma média de 18% entre 2001 e 2005, e de 16,5% no ano passado.

Em relatório recentemente divulgado, Marinis comenta que "o ritmo de preenchimento da meta de superávit no primeiro bimestre de 2006 caiu praticamente à metade do observado no mesmo período do ano passado, e para menos da metade da média histórica". Em 2002, o único outro ano eleitoral desde o início da atual política fiscal, 16,3% da meta de superávit primário foi realizada no primeiro bimestre.

A meta de superávit primário tem sido religiosamente cumprida desde o início da atual política, em 1999, e é considerada pelos investidores um dos principais alicerces do equilíbrio macroeconômico brasileiro. Agora, uma pequena, mas não insignificante, sombra de dúvida paira o mercado, com base numa sucessão de fatores.

O primeiro foi a derrota do ex-ministro da Fazenda, Antonio Palocci, no seu embate com a ministra da Casa Civil, Dilma Roussef, na queda-de-braço pelo tamanho do superávit em 2005 e 2006. Apesar de Palocci querer mantê-lo próximo a 5% do PIB, foi decidido que em 2006 ele recuaria dos 4,8% de 2005 para o cumprimento estrito da meta oficial de 4,25%.

Com a queda de Palocci e a sua substituição por Guido Mantega, fortaleceu-se a impressão de que não errar para mais no esforço fiscal tornou-se para o governo uma prioridade tão importante quanto não errar para menos - ao contrário dos tempos de Palocci. O sentimento baseia-se em que, no passado, Mantega teceu críticas à magnitude do esforço fiscal pós-1999. O fato de 2006 ser um ano eleitoral, obviamente, reforça aquela sensação.

Estas preocupações somam-se ao fraco desempenho do primeiro bimestre para atiçar os temores do mercado, onde circula a versão de que melhoras iminentes no rating brasileiro foram adiadas por duas das grandes agências internacionais por causa de incertezas fiscais. A bem da verdade, tendo se tornado ministro há poucas semanas, não se pode atribuir a Mantega o resultado fiscal de janeiro e fevereiro. E o novo ministro e seus auxiliares têm repetidamente dito que a meta de 2006 é "sagrada".

Segundo Marinis, o governo terá de fazer superávits bem acima da média histórica em pelo menos dois meses, até o fim do ano, para atingir os 4,25% do PIB.