Título: Pêlos de Cristo, polêmica em Mauá
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Fonte: O Estado de São Paulo, 14/04/2006, Vida&, p. A18

Por causa de cartaz, vereadores tentam vetar encenação da Paixão na cidade

Os pêlos pubianos aparentes de um Jesus contemporâneo no cartaz de uma encenação da Paixão estão causando polêmica na cidade de Mauá, na Grande São Paulo.

A reprodução da pintura Nihil Obstat, do artista plástico Antônio Valentim Lino, no material de divulgação da peça Os caminhos de Jesus. A Paixão de Cristo custou ao diretor de cultura do município, Valter Carriel, muitas explicações. Na pintura, Jesus é retratado crucificado de terno e gravata, com os pêlos pubianos à mostra.

Em sessão extraordinária, a bancada evangélica da Câmara Municipal exigiu de Carriel a retirada de circulação do material e explicações quanto ao conteúdo do espetáculo, de autoria de Gilda Vandenbrande.

O vereador Diniz Lopes dos Santos (PL), presidente da Câmara, classificou como "absurda" a escolha da pintura para divulgar o espetáculo teatral. "Fiquei estarrecido com o que vi, assim como a maioria da população de Mauá", disse.

Os vereadores assistiriam aos ensaios da peça para estudar as medidas legais que poderão tomar para impedir a apresentação, cuja estréia está prevista para hoje, quando tradicionalmente se encena a Paixão. "O problema todo é que se trata de dinheiro público. É dever da Câmara fiscalizar", explicou Santos. "O poder público não tem religião, mas seus representantes, sim. Vamos conversar com a Igreja Católica e ver quais são as medidas cabíveis."

O espetáculo ambienta a trajetória do sofrimento de Cristo, do julgamento até a ressurreição nos dias de hoje em uma grande cidade. Com um elenco de 150 atores, coral e figurantes, a montagem busca "questionar o destino dado aos ensinamentos de Cristo".

Supervisor da montagem e diretor municipal de cultura, Valter Carriel se diz incomodado com a repercussão negativa da peça. "Ficamos reféns da ignorância preconceituosa desses vereadores", conta. "Eles não estão preocupados com a cultura, com a inclusão social ou cultural", argumentou.

Nem mesmo para o cônego Belizário Elias de Souza, há 40 anos em Mauá, a repercussão ruim se justifica. Ele credita a movimentação da Câmara a motivações políticas de vereadores que querem aparecer. "Acho que aproveitaram para criar um conflito com a Igreja que não existe", diz. "Há muita coisa mais importante para ser cuidada em nossa cidade."

A peça será encenada hoje, amanhã e domingo, em duas apresentações (às 18 e às 20 horas), no Teatro Municipal de Mauá, na Rua Gabriel Marques, s/nº, no centro da cidade.