Título: PF prende 2 ex-deputados e mais 44 por desvio de R$ 60 milhões
Autor: João Domingos e Sérgio Gobetti
Fonte: O Estado de São Paulo, 05/05/2006, Nacional, p. A4

A Polícia Federal prendeu ontem 46 pessoas, entre elas os ex-deputados Carlos Rodrigues (PL-RJ)- conhecido por Bispo Rodrigues - e Ronivon Santiago (PP-AC), assessores de oito deputados e do líder do PMDB no Senado, Ney Suassuna (PB), funcionários dos Ministérios da Saúde e do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior e empresários, todos suspeitos de participar de uma quadrilha que desde 2001 fraudava processos de licitação e compra de ambulâncias para municípios, a partir do desvio de verbas do Orçamento da União. Falta encontrar ainda outras oito pessoas com mandados de prisão já expedidos, entre eles dois assessores da Câmara.

A fraude envolveu a compra de mil ambulâncias, num valor total de R$ 110 milhões dos cofres federais, de acordo com informações do diretor-regional-executivo da Polícia Federal de Mato Grosso, Tardelli Boaventura, que comandou os trabalhos da chamada Operação Sanguessuga.

A quadrilha tinha sede em Cuiabá. "O comando da fraude era da família Trevizan Vedoin, que centralizava tudo na empresa Planam", disse Tardelli. "Calculamos que o preço foi superfaturado em pelo menos 110%. Portanto, entre R$ 50 milhões e R$ 60 milhões foram desviados do Orçamento da União." Ambulâncias eram vendidas como se fossem uma UTI móvel completa, mas quase sempre tinham apenas uma maca e uma haste para o soro.

MENSALÃO

Muitos dos assessores presos foram demitidos ontem mesmo. Eles trabalhavam com parlamentares de partidos envolvidos no escândalo do mensalão, como PP, PL e PTB. Rodrigues renunciara para fugir da cassação, pois era um dos principais suspeitos de envolvimento com o esquema montado pelo empresário Marcos Valério e pelo ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares pelo qual partidos aliados recebiam dinheiro para dar apoio ao governo.

Rodrigues não esperou a PF procurá-lo. Ao saber que havia contra si um mandado de prisão provisória (que vale por cinco dias, prorrogáveis por mais cinco), entregou-se na Superintendência da Polícia Federal, em Brasília. Sem óculos, com os cabelos eriçados, vestindo uma camiseta azul, com calças e paletó escuros, ele caminhou tranqüilamente até a entrada da PF, um pouco antes das 11 horas. Misturou-se às dezenas de pessoas que aguardavam na fila para tirar passaporte e quase passou despercebido pelos fotógrafos de plantão. Mas acabou sendo reconhecido.

Apresentou-se, prestou depoimento e recebeu ordem de prisão. Outras 14 pessoas foram também presas pela PF em Brasília.

Ronivon Santiago, o outro ex-parlamentar preso, foi capturado por policiais no Acre. Ele já protagonizara um escândalo em 1997, quando foi acusado de ter vendido seu voto a favor da emenda constitucional que permitiu ao então presidente Fernando Henrique Cardoso disputar a reeleição. Na ocasião, Ronivon renunciou ao mandato, mas foi reeleito em 2002. Assumiu o mandato, mas acabou cassado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) por comprar o voto de eleitores. Também foram presos assessores dos deputados Vieira Reis (PRB-RJ), Nilton Capixaba (PTB-RO), Maurício Rabelo (PL-TO), Elaine Costa (PTB-RJ), Edna Macedo (PTB-SP), João Mendes (PSB-RJ) e pastor Pedro Ribeiro (PMDB-CE).

De acordo com informações do delegado Tardelli Boaventura, desde 2004 foram instalados 140 inquéritos para apurar a fraude, iniciativa tomada a pedido da Controladoria-Geral da União (CGU), que suspeitou do preço das ambulâncias nas auditorias feitas nos municípios. Com permissão judicial, instalou grampos telefônicos. Em março deste ano, conseguiu quebrar o sigilo bancário dos suspeitos. Percebeu que havia uma movimentação muito grande nas contas.

PROPINA

Ainda conforme informações do delegado da PF, de cada ambulância repassada ao município a quadrilha recebia propina de 10%. Isso, sem contar o superfaturamento. Maria da Penha Lino, que por influência da Planam passou a trabalhar como assessora direta do então ministro da Saúde Saraiva Felipe a partir de 1º de agosto do ano passado, recebia, de acordo com o delegado, de R$ 2 mil a R$ 10 mil por processo que liberava. Liberou centenas.