Título: Em vez de pressão, tom da reunião foi de solidariedade
Autor: Tânia Monteiro e Mariana Barbosa
Fonte: O Estado de São Paulo, 05/05/2006, Economia & Negócios, p. B1

O encontro entre os líderes da Argentina, Bolívia, Brasil e Venezuela em Puerto Iguazú, na Argentina, foi marcado por uma demonstração de solidariedade às medidas de nacionalização das reservas de petróleo e de gás pelo presidente boliviano Evo Morales.

"Reconhecemos o papel da Bolívia de definir sua soberania sobre suas riquezas minerais", disse o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. "Respeitamos a decisão soberana", completou o colega argentino, Néstor Kirchner. Para Hugo Chávez, da Venezuela, foi um "ato histórico" que vai contribuir para a "refundação" da Bolívia.

Além de elogiado pelos colegas, Evo foi convidado a fazer parte do grande projeto de "integração energética" do continente, o megagasoduto orçado em mais de US$ 23 bilhões. Os presidentes também acordaram que Evo apresentará "em breve" uma "lista de demandas" aos países vizinhos. "Estamos nos colocando à disposição para discutir de que forma podemos trabalhar juntos para elaborar projetos que possam contribuir para o desenvolvimento da Bolívia e melhorar a qualidade de vida de sua gente", afirmou Lula.

Na entrevista após o encontro - considerado pelos quatro líderes como "histórico" e o "melhor dos últimos anos" -, os quatro presidentes se preocuparam em dar uma demonstração de unidade. "O Brasil não quer hegemonia, quer parceria", disse Lula, repetindo a frase em relação à Argentina, à Venezuela e à Bolívia. Ele disse não acreditar numa aliança entre Venezuela e Bolívia contra os interesses do Brasil ou da Argentina.

"É dos conflitos que nasce a fortaleza das nossas relações. Os quatro presidentes aqui reunidos não farão nenhum gesto para que a integração sul-americana não dê certo." Lula ressaltou a importância de os países se apresentarem ao mundo de forma unida para que seja passado "aos investidores estrangeiros em cada país a certeza de que não queremos continuar sendo um continente eternamente pobre". Para Lula, "chegou a hora" de mostrar que os países do continente viraram "adultos responsáveis, donos do nosso nariz".

Ademonstração de unidade, continuou Lula, será apresentada na próxima reunião entre América Latina e União Européia, em Viena, nos encontros da Organização Mundial do Comércio e em outros fóruns.

Em Brasília, à noite, o vice-presidente José Alencar afirmou que ficou bem impressionado com a forma como Evo procedeu."As pessoas que estão assistindo à distância querem ver sangue, mas não é esse o caso." Alencar relatou que, na reunião de Puerto Iguazú, "houve uma demonstração de grande entendimento" e que "a sinalização aponta no sentido de se respeitarem os contratos, porque há direitos internacionais que cuidam disso".