Título: Sob controle
Autor: Celso Ming
Fonte: O Estado de São Paulo, 08/04/2006, Economia & Negócios, p. B2

É tão forte a ansiedade por mais crescimento econômico que pouca gente no Brasil vai dando a atenção que deveria dar ao que vem acontecendo com a inflação.

Em novembro de 2002, ano eleitoral, a expectativa era de que a inflação anual saltaria para acima de 11% (acabou em 12,5%). Neste ano, com crise política e tudo o mais, a expectativa é a de que a inflação pare nos 4,5%, como atesta a pesquisa Focus, do Banco Central.

Enfim, não só a inflação vai convergindo para a meta, de 4,5% ao ano, como, também, os agentes econômicos acreditam nisso. Isso significa que a inflação deste ano tem mais probabilidade de ficar nos 4,5% porque os fazedores de preço acreditam em que a meta será cumprida. Quando isso ocorre, contêm as remarcações nesse mesmo patamar, porque temem perder mercado para o concorrente.

Quinta-feira, a Fundação Getúlio Vargas divulgou o IGP-DI (Índice Geral de Preços - Disponibilidade Interna) que no passado foi medida da inflação oficial. A novidade é que, pela primeira vez desde 1944, quando o índice começou a ser pesquisado, a inflação em 12 meses ficou negativa: - 0,29%.

Ontem foi a vez de o IBGE divulgar o IPCA, a medida de inflação que serve para definir o tamanho dos juros. O que se viu foi uma inflação em março de 0,43% que só não foi mais baixa porque teve carga especialmente elevada, de 9,21%, no reajuste dos combustíveis (em fevereiro). Só para lembrar, os preços do álcool subiram a partir de dezembro, início da entressafra da cana-de-açúcar. Para evitar crise no abastecimento, o governo reduziu a participação do álcool na mistura carburante e, por isso, a gasolina, com menos álcool, ficou mais cara.

Mas a alta dos preços dos combustíveis já foi absorvida no custo de vida e não deve pesar nas estatísticas de abril. Assim, deve contribuir para o enquadramento da inflação na meta.

Apesar da alta do petróleo e das commodities, estamos em período de baixa expectativa de inflação em todo o mundo. Os Estados Unidos enfrentam inflação de 3,6% ao ano; a área do euro, de 2,3%; e o Japão, de 0,5%. Com exceção da Indonésia (17,9%), Venezuela (12,5%), Argentina (11,3%), Rússia (11,1%), Turquia (8,2%), Paquistão (8,0%) e Filipinas (7,6%), os demais países emergentes que integram a lista da revista The Economist ostentam, no momento, inflação anual abaixo dos 6%.

São três os principais fatores que concorrem para isso: o forte emprego de Tecnologia de Informação, que aumenta a produtividade em todo o mundo; a corrida à industrialização na China e vizinhos asiáticos, que despeja no mercado mundial produtos cada vez mais acessíveis; e os baixos juros de longo prazo, que favorecem o investimento com capitais cada vez mais baratos.

No Brasil, a queda consistente da inflação tem relação tanto com a queda do dólar (âncora cambial), que aumenta a concorrência interna a partir de baixa de preços dos importados, quanto com os juros altos (âncora monetária), que contiveram o consumo. Difícil dizer qual desses fatores concorreu mais para o enquadramento da inflação. O que dá para afirmar é que, sem a fartura de recursos no mercado mundial e sem o bom momento da economia global, seria bem mais difícil derrubar a inflação.

A principal conseqüência dessa inflação consistentemente mais baixa é a de que aumentam as condições para um crescimento econômico mais estável. A meta de inflação deste ano (4,5%) será mais facilmente atingida do que a do ano passado (5,1%) porque veio de uma base bem mais alta (7,6% em 2004). E a meta de 2007 (também 4,5%) será ainda mais facilmente atingida do que a de 2006, porque pressupõe só a manutenção da temperatura da caldeira.