Título: Aprovação de relatório deixou Renan aliviado
Autor: Eugênia Lopes, Luciana Nunes Leal
Fonte: O Estado de São Paulo, 08/04/2006, Nacional, p. A10

Senador temia que CPI acabasse como as do Mensalão e Banestado; no balanço final dos dez meses, aliado de Lula diz que 'podia ter sido pior'

Na balança de vitórias e derrotas da CPI dos Correios, a investigação que apontou um milionário esquema montado pelo PT para compra de votos e financiamento ilegal de campanhas, a oposição tem mais vantagens a contar. Ao governo restou o alívio que um aliado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva assim resumiu, no final: "Podia ter sido pior."

Nas duas últimas semanas da CPI, o presidente do Congresso, senador Renan Calheiros (PMDB-AL), era um dos mais preocupados com a possibilidade de a investigação chegar ao fim, depois de dez meses, sem um relatório final.

O senador não queria a repetição do que houve com as CPIs do Banestado e do Mensalão. "O pior cenário é não ter relatório", insistia. Frustrada a tentativa de um acordo de última hora e apesar do tumulto da última sessão, a base governista reconhecia que, pelo menos, não teve o ônus de derrubar o documento do relator Osmar Serraglio (PMDB-PR): a maior parte dos governistas da CPI optou por não votar, em protesto contra o modo que o presidente da CPI, Delcídio Amaral (PT-MS), conduziu os trabalhos.

Um aliado do presidente Lula que participou das investigações comparou o andamento da CPI a uma montanha-russa. Para ele, um dos piores momentos foi o depoimento do marqueteiro Duda Mendonça, que confessou ter recebido do PT R$ 10 milhões de caixa 2, depositados ilegalmente em uma conta nas Bahamas.

O senador tucano Arthur Virgílio (AM) disse, na ocasião, que "o impeachment do presidente não pode mais ser palavrão", enquanto Álvaro Dias (PSDB-PR) falava em "estelionato eleitoral".

A todo momento se temia que algum aliado de Lula com depoimento marcado comprometesse o presidente. Nenhuma denúncia, porém, o atingiu diretamente. Hoje, muitos petistas reconhecem que foi difícil fazer uma defesa veemente da condução da campanha petista diante de tantas exigências de pagamentos ilegais. O deputado Maurício Rands (PT-PE), no entanto, insiste: "Nós não quisemos esconder nada. Nunca negamos que houve repasses ilegais e que essa prática deve ser extirpada da política nacional. O que não aceitamos é dizer que há uma relação de causalidade com as votações (de assuntos de interesse do governo) e com as trocas de partidos." Outro petista, o mineiro Carlos Abicalil, passou a CPI lembrando que "a origem do esquema de Marcos Valério foi a campanha de Eduardo Azeredo em Minas."

ESFORÇO INÚTIL

De fato, a campanha pela reeleição de Azeredo, em 1998, recebeu R$ 9 milhões do caixa 2 de Marcos Valério. Os petistas também repetiam à exaustão o recebimento pelo deputado Roberto Brant (PFL-MG) de R$ 102,8 mil não declarados à Justiça Eleitoral, no ano 2000. Mas o discurso governista teve pouco efeito.

"Não adiantou tentar desviar o foco. Não havia como encobrir o maior esquema de corrupção de que se tem notícia no País, patrocinado pelo PT", diz o deputado pefelista Antonio Carlos Magalhães Neto (BA), um dos parlamentares que se destacaram nos ataques ao PT e ao governo durante as sessões da CPI. Para os tucanos, o embate teve sabor de vingança depois da ferrenha oposição do PT durante os oito anos de mandato de Fernando Henrique Cardoso. "O PT sempre acusou o governo FHC de uma série de mentiras", relembra o deputado Eduardo Paes (RJ).

Encerradas as investigações, Paes e ACM Neto já mostram o discurso para a campanha eleitoral. "O impeachment do presidente Lula será nas urnas", diz o pefelista. "Quero ganhar do PT não porque é um governo de corruptos, mas porque é um governo incompetente", provoca o tucano.

No seu balanço das investigações e desfechos, o senador Jefferson Peres (PDT-AM) elogia o relatório final de Serraglio, mas lamenta que o deputado não tenha afirmado que o presidente Lula sabia das ilegalidades. "Eu teria dito: conquanto não haja provas, há evidências de que o presidente da República sabia."

Peres lamenta que os processos contra os parlamentares denunciados pela CPI tenham resultado em pizza, na maioria dos casos. "Houve um processo indecoroso de suborno. Se o Congresso não cassa esses parlamentares, estamos num processo deplorável. É a banalização do mal", afirma o senador pedetista.

O pesquisador da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Carlos Eduardo Sarmento se diz "extremamente cético" em relação às CPIs. Para ele, embora revelem fatos importantes, sua marca principal é "o uso de dois instrumentos: a coação e o espetáculo midiático".