Título: Lula afaga MST e cita ruralistas caloteiros
Autor: Leonencio Nossa
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/04/2006, Nacional, p. A12

Movimento social tem de reivindicar, diz ele, na contramão de Rodrigues

Um dia depois de o ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues, classificar de vandalismo as ações dos sem-terra, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez agrados aos chamados movimentos sociais, cujo grupo de maior destaque é o MST. Em visita a três cidades do Rio Grande do Sul, Lula atacou ontem os grandes fazendeiros, apontando a existência de caloteiros entre eles.

Lula também estimulou os movimentos sociais a aproveitarem a oportunidade para fazer mais reivindicações e criticou seu antecessor, o presidente Fernando Henrique Cardoso. "Não tenham medo de reivindicar", disse, ao discursar durante visita a uma aldeia de índios caingangues. "Se têm de reivindicar, aproveitem e reivindiquem no meu governo, pois, se eu não atender, muito mais difícil será ser atendido (depois)."

Antes do discurso, um agricultor chamou a atenção na platéia. "Lula, salve a agricultura!", gritou o homem. O presidente, então, reclamou dos fazendeiros que dão calote. "Alguns neste país não pagam (a dívida) quando você faz o refinanciamento", disse. "Se a gente não der um chega para lá nisso, estimula os honestos a virarem desonestos, pois passa a ser vantagem não pagar", prosseguiu. "É preciso separar as laranjas podres das boas para não perder o pomar."

Lula afirmou que vetou projeto aprovado pelos parlamentares que beneficiaria 590 grandes produtores em dívida com o governo e custaria R$ 7 bilhões aos cofres públicos. "Preferimos atender aos pequenos produtores." O presidente salientou que o "céu" costuma se "rebelar", causando enchentes e secas. "Temos de saber o que é crise e o que é esperteza."

Em discurso de 33 minutos, feito boa parte de improviso, o presidente defendeu o programa Bolsa Família. "Eu sei que muita gente não gosta e queria que a gente gastasse todo o dinheiro do Estado apenas com a aquela parte que há 500 anos recebe esse dinheiro", afirmou. "Achamos que o dinheiro do Estado deve ser repartido de forma justa."

Lula disse que "mais extraordinário" não é investir em pontes e postes, mas na melhoria da vida das pessoas. "Tem gente que diz assim: 'o Lula, ao invés de gastar dinheiro fazendo isso, deveria estar fazendo outra coisa.'" O presidente fez brincadeira ao falar da inauguração de uma rádio comunitária na aldeia, que só transmitirá notícias nas línguas caingangue e guarani.

"Fico pensando como eles vão falar mal de mim nessa rádio", disse Lula, que evitou comentários sobre a crise política e as denúncias contra sua gestão. Segundo o presidente, nada é impossível quando se pensa em melhorar a vida dos mais pobres. "Estou aprendendo e, lamentavelmente, só aos 60 anos e no último ano de governo, que não existe nada impossível", ressaltou.

O governo investiu R$ 2,5 milhões na rede de energia elétrica na reserva indígena. O programa Luz para Todos beneficia um total de 1.071 famílias caingangues.