Título: Ministros bolivianos feitos reféns são libertados em ação violenta
Autor: João Naves
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/04/2006, Economia & Negócios, p. B10

Manifestantes protestavam contra o embargo da construção de siderúrgica brasileira

Três ministros bolivianos foram libertados na manhã de ontem - numa ação descrita como violenta, envolvendo 100 policiais - depois de terem sido feito reféns na noite de terça-feira na cidade de Puerto Suarez, divisa com Corumbá no Pantanal de Mato Grosso do Sul. A ação fez parte de protesto pelo embargo das obras da Siderúrgica EBX, do empresário brasileiro Eike Batista. Carlos Villegas, Walter Vilarroel e Celinda Sossa, ministros do Desenvolvimento Sustentável, Minas e Desenvolvimento Econômico, respectivamente, ficaram presos na sede do Comitê Cívico. Pelo menos três mil bolivianos estão mobilizados para evitar novas ações criminosas.

Depois que os policiais invadiram o local e libertaram os ministros, uma multidão bloqueou a fronteira entre Arroyo Concepción e Corumbá impedindo o trânsito até de pedestres. O presidente do comitê, Edil Gericke, afirmou que não há previsão de liberação da fronteira e tampouco da rodovia que liga Puerto Suarez a Santa Cruz de La Sierra.

A estação ferroviária de Puerto Quijarro, vizinho de Puerto Suarez, amanheceu fechada com aviso fixado na entrada principal informando aos passageiros que por causa do clima de insegurança, o expediente foi encerrado sem data para o retorno ao normal.

Como principal líder do protesto, Gericke afirmou que a atitude foi autoritária e viola a Constituição política do país. "O presidente Evo Morales jamais poderia usar o Exército contra o povo. Durante sua campanha eleitoral, usou o artifício dos bloqueios que acontecem aqui para conquistas políticas." Demonstrando nervosismo com gestos rápidos dos braços e semblante de decepção, disse em tom alto que o governo quer "uma briga feia e vai ter".

Em resposta, o presidente boliviano disse que não tem medo dos manifestantes e não vai aceitar provocações, reiterando sua determinação de "expulsar as máfias que integram empresas ilegais de países vizinhos".

Tudo começou na semana passada, quando começaram correr boatos de que as obras da EBX seriam interditadas. A confirmação chegou pelos três ministros que foram pessoalmente a Puerto Suarez anunciar a decisão governamental. "Foi a gota d'água que faltava", comentou Edil Gericke. Ele explicou que a EBX iniciou as obras em Puerto Suarez em agosto de 2005 e emprega 900 trabalhadores de Puerto Suarez e cidades vizinhas, onde há escassez de trabalho e a maioria vive da venda de produtos regionais e importados. O custo estimado para a conclusão da obra é de US$ 1,5 bilhão.

Para o ministro do Desenvolvimento Sustentável, Carlos Villegas, a construção da siderúrgica foi embargada porque desrespeitou regras de proteção ao meio ambiente. Segundo o governo boliviano, a obra também está sendo erguida em um limite inferior a 50 quilômetros da faixa de fronteira, o que contraria a Constituição do país.

Villegas adiantou que os ministros, juntamente com Evo Moralles, continuarão buscando a compreensão da população, no sentido de manter o embargo.

Essa posição poderá resultar em problemas mais graves, segundo as correntes contrárias às alegações oficiais. Elas declararam que a partir de hoje está decretado o "paro cívico" (greve cívica), que começa com a adesão e apoio integral de 16 prefeitos da região "Chiquitania" - cidades na divisa com o Brasil.