Título: Um agrado aos sindicalistas
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Fonte: O Estado de São Paulo, 10/05/2006, Notas e Informações, p. A3

O novo pacote sindical e trabalhista lançado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva destina-se muito mais a agradar aos sindicalistas, especialmente àqueles com maiores ambições políticas, do que a proteger os interesses dos trabalhadores. Só um dos três documentos assinados pelo presidente, na segunda-feira, em cerimônia no Palácio do Planalto, cuidou diretamente desses interesses. Foi o projeto de lei com regras para o funcionamento das cooperativas de trabalho.

Sintomaticamente, apenas esse tema foi tratado como projeto de lei. O presidente recorreu a medidas provisórias para definir o status das centrais e para criar o Conselho Nacional de Relações do Trabalho (CNRT), órgão de natureza consultiva e deliberativa.

O governo atribuiu, portanto, maior urgência a esses dois objetivos do que à regulamentação do funcionamento das cooperativas. A avaliação normal seria a oposta, se o presidente e o ministro do Trabalho, Luiz Marinho, estivessem mais preocupados com os problemas substantivos do trabalhador. Além do mais, nenhum daqueles dois assuntos se enquadra nas condições de urgência e relevância requeridas para a edição de MPs. É evidente, portanto, a motivação política do pacote - até porque já tramita no Congresso, desde o ano passado, um projeto de reforma sindical.

Uma das MPs atribui às centrais sindicais a função legal de representação dos trabalhadores "em fóruns, colegiados de órgãos públicos e demais espaços de diálogo social que possuam composição tripartite, nos quais estejam em discussão assuntos de interesse geral dos trabalhadores". Essa representação é estritamente política, pois as centrais não são organismos sindicais. Só poderão alcançar esse status por meio de emenda à Constituição. Mas a preocupação dos sindicalistas, na apresentação do pacote, foi de outra ordem. Não discutiram a conversão das centrais em órgãos do sindicalismo, mas a forma de participar do bolo do Imposto Sindical.

Para exercer a representação, argumentaram, as entidades vão precisar de mais dinheiro. A receita do imposto é dividida entre sindicatos, federações, confederações e governo. "Queremos os 20% que hoje vão para o governo", disse o presidente da Força Sindical, Paulo Pereira da Silva. O presidente da CUT, João Felício da Silva, propôs emendar o texto da MP enviada ao Congresso para redividir o bolo.

Há décadas, quando começou o debate sobre a reforma do sindicalismo brasileiro, foi sugerida a extinção do Imposto Sindical. Seria uma forma de tornar os sindicatos menos dependentes do Estado e mais autenticamente representativos dos assalariados. Noutros tempos, os fundadores da CUT simpatizavam com essa idéia. Hoje, os integrantes da cúpula do sindicalismo parecem menos interessados em livrar-se daquela dependência, uma das marcas do velho peleguismo.

A outra MP também se refere a questões de organização política. O Conselho Nacional de Relações do Trabalho deverá servir para negociações de cúpula entre representantes do governo, de empregadores e de empregados. Substituirá o Fórum Nacional do Trabalho como um colegiado permanente e deverá contribuir para a formulação de políticas públicas.

O Fórum cumpriu mal essa função. Serviu para a elaboração do projeto de reforma sindical, há mais de um ano empacado no Congresso, mas foi incapaz de produzir uma proposta de modernização das leis trabalhistas. Nada autoriza a suposição de que o novo conselho tenha maior êxito no cumprimento dessa tarefa.

Apenas o projeto de regulamentação do funcionamento das cooperativas de trabalho cuidou de uma questão substantiva para os interesses dos trabalhadores. Um dos objetivos é evitar que as cooperativas funcionem como instrumentos de mera terceirização de mão-de-obra. O texto fixa condições de representatividade e participação dos associados nas decisões das cooperativas. Só uma discussão detalhada permitirá avaliar melhor os méritos e defeitos do projeto, mas a proposta, à primeira vista, representa um avanço. É a melhor parte de um pacote pobre.