Título: Parlamentar ficava com até 15% de emenda liberada, diz assessora
Autor: Sônia Filgueiras e Sérgio Gobetti
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/05/2006, Nacional, p. A4

A ex-assessora do Ministério da Saúde Maria da Penha Lino, presa na quinta-feira na chamada Operação Sanguessuga, decidiu, em troca do mecanismo da delação premiada, entregar todo o esquema de venda de ambulâncias e equipamentos superfaturados para prefeituras com recursos do Orçamento da União. Ele é muito mais amplo do que as escutas telefônicas da Polícia Federal indicavam. Em um longo e detalhado depoimento dado à PF e ao Ministério Público Federal de Cuiabá, Maria da Penha revelou, segundo seu advogado, Eduardo Mahon, que 170 parlamentares participavam das fraudes dedicando emendas à compra de ambulâncias e recebendo em troca 10% a 15% de seu valor como propina, num esquema que movimentou pelo menos R$ 110 milhões.

"Ela marcou os nomes em uma lista. Mas não vou revelá-los. Seria leviano", afirmou o advogado.

Mahon disse que, nos próximos dias, a ex-assessora continuará dando depoimentos diários às autoridades para detalhar a participação de cada um dos parlamentares citados no esquema. Além do senador Ney Suassuna (PMDB-PB) e dos 64 nomes de deputados já identificados pela PF, ela revelou que também participariam do esquema, entre outros, os deputados Inaldo Leitão (PL-PB), Ann Pontes (PMDB-PA) e Almerinda de Carvalho (PMDB-RJ.

Em seu depoimento, a ex-assessora também inocentou alguns parlamentares que tiveram o nome citado pelos empresários nos grampos da PF, entre eles as deputadas Denise Frossard (PSB-RJ) e Thelma de Oliveira (PSDB-MT), mulher do ex-governador Dante de Oliveira.

Maria da Penha disse que muitas vezes a propina era paga aos parlamentares antes mesmo da liberação dos recursos das emendas. O dinheiro chegava aos gabinetes, no prédio do Congresso, em Brasília, dentro de malas, metido na cueca e nas meias dos dois chefes do esquema, o empresário Darci Vedoin, dono da Planam, e seu filho e sócio Luiz Antônio.

A propina era entregue em mãos aos parlamentares e, na grande maioria dos casos, em espécie. A ex-assessora do ministro da Saúde revelou ainda que o esquema se concentrava sobretudo na Câmara dos Deputados e isentou de responsabilidade os assessores de parlamentares presos na Operação Sanguessuga. Segundo ela, todos agiam segundo as ordens de seus chefes. No caso de Suassuna, por exemplo, disse que o senador mantinha contatos diretos com ela.

Citada nominalmente por Maria da Penha, Ann Pontes vem há três anos apresentando emendas destinando dinheiro para os municípios do Pará adquirirem ambulâncias com dinheiro federal. Em 2004, ela foi contemplada com R$ 779,4 mil para seis municípios, e em 2005, com R$ 1,1 milhão para outras sete cidades.

De acordo com a ex-funcionária do Ministério da Saúde, o esquema da Planam tinha especial influência e apoio da bancada evangélica na Câmara.

Entre os Estados, o Rio de Janeiro é o que recebeu o maior volume de recursos para ambulâncias, seguido por São Paulo. Deputados como João Mendes de Jesus (PSB-RJ) e Elaine Costa (PTB-RJ) não só apresentavam emendas para aquisição de unidades móveis de saúde, como também ônibus de "integração digital" que também eram montados pela Planam.

Nos últimos dois anos, 177 parlamentares apresentaram emendas destinando recursos para aquisição de ambulâncias, num total de R$ 220 milhões.

Em 2006, segundo levantamento da ONG Contas Abertas, subiu para 261 o número de deputados e senadores que reservaram parte de suas emendas para essa finalidade. Até mesmo o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e o presidente da Comissão de Orçamento, deputado Gilmar Machado (PT-MG), estão nessa lista. Mas a simples apresentação de emenda não representa indício de crime.