Título: Sem convencer, Bastos nega ter ocultado violação de sigilo do caseiro
Autor: Luciana Nunes Leal, Fausto Macedo
Fonte: O Estado de São Paulo, 21/04/2006, Nacional, p. A4

Em depoimento na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, ministro diz que cumpriu seu dever

O ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, a quem a oposição chamou de "advogado-geral do Lulão", admitiu ontem ter indicado um criminalista para aconselhar o ex-ministro Antonio Palocci, mas negou que tenha sido mentor de um plano para acobertá-lo no caso da violação do sigilo bancário do caseiro Francenildo dos Santos Costa, o Nildo. "Dizer que eu arquitetei defesas, que sou o grande advogado oculto do governo, o Rasputin, é absolutamente inverídico", declarou. Mas não convenceu a oposição nem evitou pesadas críticas à sua conduta .

Interrogado por quase oito horas na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, Bastos afirmou que Palocci pediu a indicação de um advogado e, como colega de ministério e amigo, se sentiu "no dever" de apresentá-lo. "Indiquei um advogado porque não advogo, não aconselho e não acoberto. Não protegi ninguém", afirmou, ao relatar como foi a apresentação do criminalista Arnaldo Malheiros, em reunião na casa de Palocci. E ressaltou que se desvinculou totalmente da atividade privada de advogado.

"Ele mente quando diz que queimou as pontes com a vida privada. Se fosse assim, não teria indicado o advogado e participado da reunião na casa do Palocci", disse o deputado Rodrigo Maia (PFL-RJ).

Embora tenha dito que foi à casa de Palocci, no dia 23 de março, só para apresentar Malheiros a Palocci, o ministro confirmou que esteve presente durante toda a reunião, da qual participou também o ex-presidente da Caixa Econômica Federal Jorge Mattoso.

O ministro repetiu várias vezes que Palocci não falou de sua participação na violação da conta nem confessou ter recebido o extrato do caseiro em sua própria casa, das mãos de Mattoso. "Eu não seria a instância a quem o ministro Palocci devesse fazer confissões. Ele não confessou nada", garantiu.

Bastos também deixou dúvidas sobre as circunstâncias em que seu chefe de gabinete, Cláudio Alencar, e o secretário de Direito Econômico, Daniel Goldberg, atenderam ao chamado de Palocci, nos dias 16 e 17 de março. O ministro alegou que a secretaria de Goldberg tem ligação direta com o Ministério da Fazenda. E que Palocci e Goldberg tinham laços de amizade.

Os oposicionistas insistiram, porém, em que Goldberg e Alencar foram chamados porque Bastos estava fora de Brasília, em Rondônia, e não pela amizade de Palocci com Goldberg. Em depoimento à Polícia Federal, Goldberg disse que Palocci o procurou "pessoalmente, na ausência do ministro Márcio Thomaz Bastos".

LULA

<;B< No depoimento, o ministro disse que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva acompanhou passo a passo, desde o início, os desdobramentos da crise que levou à queda de Palocci. Ele citou Lula em pelo menos três ocasiões, ao detalhar reuniões mantidas no Palácio do Planalto. Disse ter alertado o presidente sobre a "gravidade dos fatos", referindo-se ao episódio envolvendo o ex-ministro na operação ilegal de quebra do sigilo de Nildo, que acusou o ex-ministro de freqüentar a mansão do Lago Sul, em Brasília, alugada pela chamada república de Ribeirão.

Os encontros com Lula, nos quais se discutiu a situação de Palocci e a invasão da privacidade do caseiro, ocorreram nos dias 21, 23 e 27 de março, segundo o relato de Bastos. "Eu tinha de cumprir o meu papel de manter o presidente informado", explicou o ministro. Segundo ele, no dia 27, durante a reunião da coordenação política, reiterou a Lula o alerta sobre "a gravidade da situação". Mattoso iria depor naquele dia. "Presenciei a conversa do presidente com Palocci. O presidente disse que a situação era insustentável." Naquele dia, Palocci caiu.