Título: Mil mulheres contra o estilista dos 40 vestidos
Autor: Christiane Samarco
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/05/2006, Nacional, p. A12

Ninguém diria que uma polêmica envolvendo vestidos daria tanto pano para manga numa eleição presidencial. Mas está acontecendo - ainda que por baixo dos panos. Depois que o estilista Rogerio Figueiredo disse ter dado à ex-primeira-dama de São Paulo Lu Alckmin mais de 400 peças de roupa de seu ateliê, o assunto entrou na moda. Explicações de Lu foram exigidas na Assembléia paulista, já que ela, como presidente do Fundo de Solidariedade do Estado, não poderia receber doações sem declará-las. Figueiredo foi ao Ministério Público para depor e esclarecer se foram 40 ou 400 peças que doou. Não se lembrava. Na manhã de ontem, essa novela - própria de ano eleitoral - teve mais um capítulo pitoresco, em plena região dos Jardins, área nobre da capital paulista.

"Ô, seu Rogério, cadê você? Viemos aqui pra devolver", cantavam em frente ao ateliê do estilista Rogério Figueiredo, na Rua da Consolação, mais de mil pessoas ligadas a associações de bairros da Grande São Paulo. Elas expressavam apoio a Lu Alckmin e repúdio a Figueiredo. Estavam dispostas a entregar vestidos para o estilista. "Ele está sentindo falta, coitado. Trouxemos alguns para ele", disse uma manifestante.

Senhoras trajadas de forma espalhafatosa, líderes nas suas comunidades, desfilaram descontraídas. Do carro de som, o locutor narrava de forma não menos irônica. "Na passarela, Bruna Lombragui." "Com vocês, toda a beleza de Giselda Bündchen", brincou, usando o nome das famosas Lombardi e Gisele.

O líder comunitário José Fernandes, morador da Freguesia do Ó, disse que "a história de Lu Alckmin não pode ser jogada no lixo por um costureiro que só quer aparecer". E ainda foi além: "Ela fez um trabalho muito sério. Ela é humilde, tem caráter, é uma mulher de luta".

Faixas de desprezo a Figueiredo e apoio a Lu foram carregadas. Moradores e pessoas que trabalham na região se surpreenderam com a massa que descia pela rua e se perguntavam quem eram Rogério e Lu. "O que eles têm contra o goleiro do São Paulo?", perguntou um passante. "Quem é dona Lu? É a mãe do goleiro?", questionou outro curioso. Quando descobriam o motivo de toda a movimentação, as pessoas davam risada da repercussão que a história havia conseguido. "Para que tudo isso?", disseram alguns.

Os manifestantes carregaram um caixão e queriam enterrar simbolicamente os vestidos doados por Figueiredo. Depois de gritos de protesto que beiravam o escracho - "Costureiro, fofoqueiro, barraqueiro" - e de um striptease dessas modelos por um dia (que vestiam tops e minishorts por baixo dos vestidos), os manifestantes foram embora. Ficou o caixão cheio de flores na calçada do ateliê de Figueiredo.

Os coordenadores do movimento negaram que o protesto tivesse motivação política, mas foi impossível conter uma manifestante que, exaltada, afirmou ao microfone que Lu Alckmin será a "futura primeira-dama do Brasil", no único trecho em que a eleição foi explicitamente lembrada. A mesma exaltada exigiu que Figueiredo assumisse que doou os vestidos para aparecer nas colunas sociais.

Quando os manifestantes já haviam se dispersado, o catador de papel Eduardo Oliveira se aproximou e colocou o caixão em seu carrinho. "Será que dá para faturar uma grana com ele? Senão, vou usar para mim", falou em voz alta. E assim, de maneira nada fashion, acabou o protesto - mas sem enterrar o assunto.