Título: STF barra investigação contra Dirceu de novo
Autor: Fausto Macedo
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/05/2006, Nacional, p. A13

O Supremo Tribunal Federal (STF) decretou ontem a suspensão de investigação criminal sobre suposto envolvimento do ex-ministro José Dirceu (Casa Civil) no esquema de corrupção em Santo André durante a administração Celso Daniel (PT), prefeito assassinado em janeiro de 2002. A ordem partiu do ministro Eros Grau e tem efeito imediato, porque ele acolheu em caráter liminar reclamação da defesa de Dirceu e frustrou a ofensiva do Ministério Público Estadual, que suspeita da ligação do ex-ministro e deputado cassado com desvio de recursos do Tesouro municipal para financiamento de campanhas eleitorais do PT.

"É mais uma vitória do povo", declarou Dirceu a seu advogado, o criminalista José Luís de Oliveira Lima, que o comunicou por telefone, na hora do almoço, sobre a decisão do STF. O ex-ministro estava em sua casa em São Paulo, quando foi avisado da medida que o livra do assédio da promotoria. Ele havia sido intimado a depor às 14 horas no Grupo de Atuação e Combate ao Crime Organizado, setor do MP.

A decisão desobrigou o ex-ministro de comparecer à audiência e de prestar esclarecimento, mas não intimidou a promotoria, que pretende convencer Eros Grau de que Dirceu "pode e deve ser investigado".

A liminar beneficia outros investigados, entre eles Gilberto Carvalho, assessor do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O ponto de partida do MP é o relato do médico João Francisco Daniel, irmão do prefeito assassinado, que denunciou em maio de 2002 ter ouvido de Carvalho que o destino de parcela do dinheiro sujo de Santo André era Dirceu, então presidente do PT. Luiz Fernando Pacheco, criminalista que defende Carvalho, sustenta que o nome de seu cliente "foi enveredado na mais fantasiosa e torpe história, mentirosa do início ao fim". Ele criticou a investigação do MP. "A ilegalidade e o arbítrio são gritantes e intoleráveis porque perpetrados em desrespeito e desobediência ao STF."

Grau, que chegou ao STF por indicação de Lula, sustenta em despacho de quatro páginas que a promotoria "não demonstra a ocorrência de fato novo no procedimento que se preste a fundamentar sua instauração".

Segundo o ministro, o MP "limita-se a juntar aos autos matérias jornalísticas que não guardam relação com o objeto das investigações. Uma delas dá conta de declaração feita pelo próprio promotor de Justiça autor do ato reclamado". A defesa de Dirceu recorreu ao STF por meio de uma reclamação, alegando que a instância máxima da Justiça já havia determinado, em agosto de 2002, arquivamento de investigação do Ministério Público sobre Dirceu. A decisão, na época, foi do ministro Nélson Jobim, que advertiu sobre os riscos de uma apuração com base em "ouvir dizer".

Oliveira Lima, que defende o ex-ministro, apegou-se à sentença de Jobim para fustigar o procedimento que o MP abriu depois que Dirceu foi cassado e denunciado pela Procuradoria da República como "chefe de organização criminosa" que operou o mensalão. O advogado anotou que a reabertura do caso afronta a decisão do STF.

"Ante a imprestabilidade da prova produzida e a inconsistência de indícios, a decisão tida por afrontada determinou o arquivamento do feito", diz Eros Grau. "Apenas novo elemento fático-probatório, produzido de acordo com as normas processuais, poderia justificar a instauração de outro procedimento para investigação dos mesmos acontecimentos."

Para o ministro, "a reutilização da prova afronta a decisão, do tribunal, que a declarou inidônea, daí porque vicia o ato reclamado, especialmente se não há fato novo que autorize sua instauração". Grau alertou sobre riscos da demora da decisão. "É incontestável (o risco) dada a possibilidade de o reclamante (Dirceu)ser compelido a imediatamente prestar depoimento, anteriormente à apreciação da reclamação pelo Pleno", sentenciou o ministro. "A prestar-se acatamento ao império da lei, a pretender-se preservar a liberdade de todos, o provimento cautelar se impõe."