Título: Bolívia e a ascensão de Chávez preocupam a União Européia
Autor: João Caminoto
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/05/2006, Economia & Negócios, p. B4

Líderes políticos europeus se preparam para a reunião com colegas latino-americanos na sexta-feira, em Viena, em um clima de perplexidade, incerteza e preocupação com os recentes eventos na Bolívia e a crescente influência regional do presidente Hugo Chávez, da Venezuela. Até recentemente, eles esperavam que a 4ª Reunião de Cúpula União Européia-América Latina serviria para reforçar os laços entre as regiões. Isso permitiria renovar o processo de liberação comercial com o Mercosul e iniciar negociações com a Comunidade Andina. Mas, agora, não conseguem identificar a liderança mais influente da região ¿ Lula ou a tríade Chávez ?

¿A América Latina está se transformando novamente num grande ponto de interrogação¿, afirma o professor da London School of Economics, Francisco Panizza.

Ele explica que, antes de o presidente Evo Morales nacionalizar as reservas de gás e petróleo da Bolívia no início deste mês, ainda prevalecia entre os europeus uma visão ¿romântica¿ do nacionalismo pregado por Chávez e a eleição de Evo na Bolívia. ¿A avaliação é de que se tratava do renascimento de movimentos que querem ter voz própria, se distanciar dos Estados Unidos, do imperialismo¿, explica o acadêmico. Mas, após a nacionalização boliviana, ¿o romantismo está acabando¿.

O motivo é óbvio: interesses de empresas européias, como a Repsol espanhola ou a British Gás britânica, estão ameaçados na Bolívia. E empresas européias temem que o mesmo possa acontecer com investimentos na Venezuela, Peru, Equador e até no México, que terá eleições presidenciais em julho.

Essa cautela pode afetar a região como um todo. ¿Para quem não acompanha muito de perto a conjuntura na América Latina, emerge uma visão simplista, que não vê que países como o Brasil que estão indo bem¿, disse Panizza. ¿Por isso, Hugo Chávez está se tornando para muitos a cara da América Latina, o porta-voz da região.¿

A incerteza não significa que a Cimeira de Viena vá fracassar. Mas como observa o chefe da cadeira de Mercosul do Instituto de Estudos Políticos de Paris, Alfredo Valadão, ¿de concreto mesmo, pouco deve avançar¿.

DIFICULDADES Apesar de o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, ter manifestado otimismo com a reunião, o acadêmico observa que as negociações entre os dois blocos dificilmente prosseguirão antes do final da rodada multilateral da Organização Mundial do Comércio (OMC), que continua num impasse. ¿Os dois lados já deixaram claro que um acordo depende da conclusão da rodada, não vão pagar duas vezes¿, disse Valadão. ¿Pode ser até que surja um novo prazo limite para o fim das negociações entre Europa e Mercosul, mas os europeus parecem estar muito menos interessados nas negociações.¿

Um fato complicador, acrescentou, é a aproximação da Venezuela ao Mercosul. ¿A avaliação entre os europeus é que a Venezuela complica o Mercosul, Chávez politizaria o bloco¿, disse. ¿Ficaria ainda mais difícil administrar o Mercosul, manter sua coerência.¿