Título: Bolívia agora quer deter 'invasão pacífica'
Autor: Agnaldo Brito
Fonte: O Estado de São Paulo, 15/05/2006, Economia & Negócios, p. B2

A tensão na fronteira entre os Estados do Acre e o Departamento de Pando, na Bolívia, deve crescer nos próximos meses. O governo do presidente Evo Morales montou um plano para frear o que classifica de "invasão pacífica" de brasileiros na faixa de fronteira. As medidas que serão tomadas a partir de agora prevêem a recuperação de terras, identificação e expulsão de brasileiros em situação ilegal e retomada do controle dos recursos florestais, estes ameaçados pela migração de várias madeireiras do Brasil para a Bolívia.

Os organismos de Estado responsáveis por essas três áreas (Instituto Nacional de Reforma Agrária, Serviço Nacional de Migração e Superintendência Florestal) terão o suporte das Forças Armadas bolivianas para garantir o cumprimento do plano de recuperação da influência na fronteira.

O plano do governo, segundo relato da diretora regional do Serviço Nacional de Migração, Ruth Araúz Cayami, é o de recuperar "a soberania, a dignidade, a terra e o território". Segundo ela, o governo Evo Morales vai perseguir o resgate desses quatro pilares do Estado.

Uma das ações que serão adotadas nas próximas semanas será a desativação de três escolas de ensino fundamental, construídas e custeadas pelo governo do Acre. Para Ruth Cayami, a existência de escolas bancadas com recursos brasileiros na Bolívia é a prova da ingerência do Estado do Acre sobre território boliviano.

Ela disse que os estabelecimentos escolares serão nacionalizados e adminstrados pelo Estado boliviano. O currículo escolar seguirá o sistema educacional da Bolívia. As professoras também serão do país.

INFLUÊNCIA

A presença brasileira na fronteira é muito grande. Famílias com áreas na Província de Nicolas Suárez, onde as primeiras notificações exigindo a saída de brasileiros foram dadas, são do ponto de vista cultural e econômico integradas e dependentes do Acre.

As crianças evidenciam como a Bolívia perde influência na região. Apesar de serem cidadãs bolivianas, nenhuma criança adotou o espanhol como língua. Falam português, por influência dos pais, mas, principalmente, pela ausência total de bolivianos na região. "Eles só convivem com brasileiros, não têm contato com nenhum boliviano", afirma o seringueiro Daniel Batista de Souza, pai de três filhas.

A constatação de que há uma "invasão pacífica" brasileira em Pando é verdadeira, mas a reversão dessa situação existente há anos pode trazer traumas.

"Sabíamos dessa situação, mas não houve qualquer governo que enfrentasse o problema no norte do País. A pergunta era: quando vamos enfrentar esse problema? Chegou a hora", diz Ruth. Segundo ela, a "invasão pacífica" é um fenômeno apenas entre o Acre e o Departamento de Pando.