Título: A fama que veio num biquíni
Autor: Ariel Palacios
Fonte: O Estado de São Paulo, 15/05/2006, Economia & Negócios, p. B4

Na sexta-feira de manhã os gualeguaychenses se exultavam com um golpe de efeito que levou o nome da cidade à fama mundial. Nesse dia, em Viena, a rainha do carnaval de Gualeguaychú deste ano, Evangelina Carrozzo, tirou a roupa e desfilou de biquíni diante dos chefes de Estado da Cúpula da União Européia-América Latina- Caribe. Evangelina levava um cartaz onde se lia: "Não às fábricas de celulose que poluem". Ao lado da legenda, as bandeiras da Argentina e do Uruguai.

O protesto era mais um capítulo na luta que os gualeguaychenses travam contra a instalação das fábricas da Botnia e Ence. Na cidade, que se orgulha de ter o mais divertido e exuberante carnaval do país, o fazendeiro Osvaldo Colombato, da ONG Assembléia Popular, que se opõe às fábricas, falou ao Estado sobre a inusitada estratégia: "As possibilidades de chamar a atenção, por parte de Gualeguaychú, não se esgotam, nem as metodologias para realizar um protesto pacífico sobre algo que é um drama."

As ruas estão cheias de sinais que mostram a oposição férrea às fábricas. As vitrines dos comércios, janelas das casas e os pára-brisas dos automóveis ostentam cartazes com a frase "Não às fábricas de celulose, sim à vida!" Nas vias de acesso à cidade, imensas faixas com frases similares pedem o fim da construção das empresas do outro lado do Rio Uruguai.

"Duas fábricas de celulose juntas! Os uruguaios são suicidas, e ainda por cima querem nos matar também!", dizem os gualeguaychenses, que estão a poucos quilômetros rio abaixo. "Eles estão pensando com o estômago. É compreensível, pois após anos de crise, aparece trabalho. Mas não percebem que em pouco tempo serão duramente atingidos pela poluição."

A maioria dos gualeguaychenses pensam em lutar até conseguir o fim da obra. É o caso do veterinário Gustavo La Rosa. "Todas as classes sociais de Gualeguaychú estão unidas nisto. Na Assembléia encontro sempre o mecânico de meu carro, que diz que fará o possível para evitar que no futuro, ao acordar, sinta um constante cheiro de ovo podre, que é o odor das fábricas."

Muitos, como a enfermeira Vanina Ortiz, pensam em partir da cidade assim que as chaminés começarem a funcionar. "Não quero ficar aqui. Não será bom para meus filhos."