Título: Silêncio foi estratégico para PCC
Autor: Marcelo Godoy ... [et al.]
Fonte: O Estado de São Paulo, 15/05/2006, Metrópole, p. C1

Acostumados a ver quase diariamente as notícias sobre as guerras de facção criminosas no Rio, até este fim de semana, era comum acreditar-se que em São Paulo o crime organizado estava sob o controle das autoridades. Para terror e surpresa da maioria, hoje sabemos que o silêncio do PCC, longe de ter sido uma demonstração de fraqueza, era uma opção estratégica da organização. Foi dessa maneira, longe dos holofotes, que as lideranças da facção ganharam força para lançar mão da maior afronta ao Estado na história da criminalidade no País.

No Rio, as organizações criminosas, que comandam o comércio de drogas no Estado desde meados dos anos 80, conseguiram acumular capital e comprar armamentos em uma quantidade incomparável com a realidade paulista. Em compensação, há rachas entre elas. Facções rivais como o Comando Vermelho, o Terceiro Comando e Os Amigos dos Amigos travam guerras permanentes. Isso as enfraquece e as torna incapazes de realizar ações como as verificadas em São Paulo.

O PCC começou a dar seus primeiros passos em 1993, quando o mundo do crime no Estado já estava maduro. As quadrilhas de roubo de carro, roubo de carga, tráfico de drogas e assaltos, apesar de muitas vezes serem bem estruturadas, nunca responderam a uma liderança incontestável, capaz de comandar as ações do crime no Estado.

Como resultado, a criminalidade cresceu em São Paulo de forma atomizada, com bocas e quadrilhas pequenas em guerras permanentes entre si. Enquanto no Rio a guerra era de facção contra facção, em São Paulo, a disputa ocorria entre criminosos, cada um por si.

Esse cenário de anomia, no entanto, era propício para o aparecimento de uma organização que fosse capaz de dar um basta a essa guerra entre "irmãos". Durante dez anos, o PCC foi ganhando espaço entre a população carcerária e os bandidos na rua. Foi quase dado como morto em 2002, depois de uma guerra entre suas lideranças que causou a morte de 15 integrantes da cúpula.

A partir de 2003, com Marcola à frente da organização, dando ordens de dentro da prisão, sem rivais para abalar o seu comando, o PCC finalmente conseguiu formar um comando capaz de direcionar seus seguidores com legitimidade.

A nova gestão passou a apostar mais fichas na parceria com traficantes de drogas e grandes criminosos. Passava a ser interessante entrar na organização não apenas para se proteger dos rivais, mas para viabilizar ações criminosas, financiadas pela facção.

Dessa maneira, para espanto geral, nesse final de semana, o PCC mostrou sua força. Uma organização criminosa com mais de cem mil seguidores, sem rivais no crime paulista, capaz de colocar o Estado em xeque diante de uma decisão de sua principal liderança.

*Bruno Paes Manso é jornalista e autor do livro "O Homem X - Uma reportagem sobre a alma do assassino em SP"