Título: Setores essenciais mantêm greve
Autor: Cleide Silva, Lígia Formenti, Eduardo Kattah...
Fonte: O Estado de São Paulo, 27/04/2006, Vida&, p. A16

Parte dos servidores decidiu voltar ao trabalho, mas os que cuidam de portos e aeroportos continuam a paralisação

A greve de servidores da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) tomou ontem dois rumos. Uma parte dos servidores, filiada à Sindiagências, resolveu retomar o trabalho, atendendo ao pedido feito pelo governo. Será uma trégua de 13 dias. No período, voltam a negociar com o governo sobre o envio de um projeto de lei para o Congresso Nacional. Eles querem, entre outras coisas, a equiparação salarial de trabalhadores antigos e novos da agência.

Mas 10% dos grevistas - filiados à Federação Nacional de Servidores da Previdência e Saúde (Fenasp) - mantêm a paralisação. Para a população, o problema continua: embora em número menor, os servidores que não voltaram ao trabalho atuam justamente em pontos de desembarque e liberação de matéria-prima de medicamentos, como o Porto de Santos e os principais aeroportos do País.

A Anvisa não se pronunciou sobre a continuidade do movimento dos servidores da Fenasp. Disse apenas esperar que grevistas respeitem a lei e observem a determinação da Justiça de manter pelo menos 30% de seus servidores em atividade, considerada essencial. Caso a regra não seja atendida, a entidade está sujeita ao pagamento de multa diária.

NAVIOS SEM VISTORIA

Ontem, em Santos, com a manutenção da greve no local, nenhum navio foi vistoriado ou teve a carga liberada. A decisão de manter o movimento reforça o racha na categoria.

"A trégua foi negociada por pessoas que não nos representam", disse Sueli Dias Pereira, fiscal da Anvisa em Santos. A decisão de suspender o movimento havia sido tomada em assembléia na terça-feira, depois que a juíza federal substituta Marcelle Ragazone Carvalho concedeu liminar determinando o fim da paralisação no porto. O descumprimento da medida gera multa diária de R$ 10 mil. Procurada pelo Estado, a juíza não quis se pronunciar.

Navios que chegam a Santos estão desviando para outros portos, onde conseguem fazer a inspeção da carga e retornam para descarregar. "É uma alternativa adotada há alguns dias, mas acarreta custos extras", disse o vice-presidente do Sindicato das Agências de Navegação Marítima do Estado de São Paulo (Sindimar), José Roque. Cada dia parado no cais representa custo extra de US$ 40 mil a US$ 90 mil aos armadores.

Ontem, havia 22 navios no cais, sendo que dois aguardavam inspeção. "Muitos estão fazendo a escala extra, pois conseguem a vistoria em outro porto e não precisam fazer em Santos", explicou Roque.

Os funcionários da agência vão realizar hoje assembléias. Em Santos, a informação é de que o Sindicato Estadual dos Trabalhadores na Saúde, Previdência e Assistência Social ainda não foi notificado da liminar que manda os servidores voltarem ao trabalho. Na avaliação dos grevistas, dificilmente a determinação será cumprida, uma vez que o sindicato tentará cassar a liminar assim que for notificado. "Não temos nada a declarar, não recebemos a notificação", afirmou Rita de Cássia Pinto, diretora da entidade.

No escritório da Anvisa no Aeroporto Internacional de Viracopos, em Campinas, ninguém se manifestou sobre a greve. Os funcionários se limitaram a informar um telefone do comando de greve em Brasília, atendido pelo fiscal José Raimundo de Santana. Segundo ele, os comandos estaduais têm até hoje, ao meio-dia, para responder se aceitam ou não a proposta do governo. "A tendência é de que não aceitem porque a proposta não garante nada ao servidor e mantém o desconto dos dias parados", disse ele.

PROBLEMAS NOS ESTOQUES

Na Bahia, os 70 funcionários da Anvisa vão realizar hoje assembléia para decidir se aceitam a proposta do governo. A paralisação está afetando o estoque de remédios da diretoria de assistência farmacêutica da Secretaria de Saúde da Bahia (Sesab), que fornece medicamentos para doenças crônicas, como aids, diabete e hipertensão, para unidades de referência do Estado. O estoque só deverá ser regularizado 60 dias após o fim da greve.

Em São Paulo, o Hospital Universitário (HU), da Universidade de São Paulo, reduziu as cirurgias por laparoscopia pela metade. "Estamos reservando bisturis só para casos de urgência", diz Paulo Andrade Lotufo, superintendente do HU. De acordo com levantamento da Associação Nacional de Hospitais Privados (ANAHP) com seus 35 associados, começam a faltar lente intra-ocular, pinças, tesoura descartável, stent e cateter.

Em Minas, subiu para 21 o número de medicamentos com estoque zerado. Entre eles, remédios para tratamento de câncer e hepatite B, além de antibióticos e antimicrobianos.