Título: Após dez anos, Caixa se diz pronta para dispensar serviços da Gtech
Autor: Vânia Cristino
Fonte: O Estado de São Paulo, 28/04/2006, Nacional, p. A14

Contrato termina no dia 14, mas haverá 90 dias de prorrogação, por medida de segurança, para troca de sistemas

Depois de quase dez anos de dependência tecnológica para prestar serviços financeiros e lotéricos em 8.870 unidades espalhadas por todo o País, a Caixa Econômica Federal finalmente vai se ver livre da multinacional Gtech - e de uma situação que produziu investigações policiais e um escândalo que terminou em CPI. Os detalhes dessa operação serão anunciados hoje pela Caixa.

Termina no dia 14 o contrato de transição de 12 meses, necessário para que as empresas vencedoras de licitação realizada no ano passado pudessem assumir o serviço. Vai ser necessária uma prorrogação de mais 90 dias para que a substituição não ofereça risco, informou o diretor de Transferência de Benefícios, Joaquim Lima.

Segundo ele, vários fatores justificam a prorrogação. Houve atraso provocado por empresas que participaram dos pregões realizados entre janeiro e março de 2005 para substituir a Gtech. Alguns concorrentes entraram com recursos administrativos e até judiciais. A Caixa só conseguiu resolver tudo em junho do ano passado, quando finalmente assinou os últimos contratos. A partir daí, começou o processo de transferência de tecnologia.

A operação diária da Caixa começa na captação dos dados, sempre que um cliente faz qualquer operação numa casa lotérica. Esses dados são transmitidos por satélite e processados numa central. Lima explicou que todo esse procedimento estava nas mãos da Gtech, que era também a dona dos equipamentos. Cabia à Caixa apenas uma espécie de auditoria e certificação dos ganhadores dos jogos.

O novo sistema adota um modelo completamente diferente. Cada uma das etapas do processo foi assumida por uma empresa. Assim, a captação de dados fica a cargo de um consórcio liderado pelo Bradesco. A transmissão de dados cabe à companhia Vicom. A Wintech do Brasil fornece os chamados "insumos", que são os volantes de aposta e bobinas para as máquinas. A própria Caixa se encarrega de todo o processamento do negócio em grandes computadores centrais. "Detemos hoje a inteligência de todo o processo", garantiu o diretor.

O gigantesco sistema de loterias da Caixa ganha de longe, em números de unidades e transações, das maiores redes bancárias do País. No ano passado, a rede lotérica foi responsável por 3,3 bilhões de operações.

É mais do que todas as operações feitas por todas as bandeiras de cartão de crédito. Pelas lotéricas, são feitos hoje mais de cem tipos de operações, incluindo saques, depósitos e pagamentos de benefícios sociais, além de quitação de contas das concessionárias de serviços públicos. Os jogos ainda representam dois terços do volume de operações, mas são responsáveis por apenas 5% do valor total das transações.

A explicação da CEF para ter ficado nas mãos da Gtech por tanto tempo é que na época da assinatura do contrato original, em 1997, o País não dispunha de tecnologia capaz de administrar um sistema dessa grandeza. Três anos depois, segundo o diretor, a Caixa iniciou as tentativas para se livrar da dependência tecnológica e operacional da Gtech. Sempre foi impedida por liminares obtidas pela multinacional na Justiça - a última delas só derrubada em agosto de 2004.

A relação entre a Caixa e a Gtech foi objeto de várias denúncias. Existe a suspeita de pagamento de propina para a renovação do contrato por 25 meses, em maio de 2003, numa manobra intermediada por Waldomiro Diniz, ex-assessor da Casa Civil, e Rogério Buratti, integrante da chamada república de Ribeirão Preto.

A atual direção da Caixa contesta a acusação e alega que vem administrando um problema herdado de gestões anteriores. O ex-presidente da Caixa Jorge Mattoso, que perdeu o cargo por causa da violação da conta bancária do caseiro Francenildo dos Santos Costa, foi chamado a depor no Congresso. A CPI dos Bingos, que ainda não concluiu os trabalhos, está convencida da existência de várias irregularidades no decorrer do contrato.