Título: Palocci é indiciado por lavagem de dinheiro e 3 outros crimes
Autor: Fausto Macedo
Fonte: O Estado de São Paulo, 28/04/2006, Nacional, p. A4

Ex-ministro ainda responderá por peculato, falsidade ideológica e formação de quadrilha, no comando da prefeitura

O ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci passou duas horas e meia, ontem à tarde, trancado em uma sala acanhada de delegacia de polícia em Brasília. Saiu dela indiciado pelos crimes de peculato (desvio de recursos públicos), falsidade ideológica, formação de quadrilha e lavagem de dinheiro.

Ouviu 30 perguntas, parte delas sobre um contrato de varrição de lixo em Ribeirão Preto, cidade paulista que administrou entre 2001 e 2002, e outra parte sobre o mensalinho - contribuição de empresas por ele contratadas - supostamente destinado ao PT.

Palocci negou que soubesse da existência de irregularidades no sistema de limpeza pública e atribuiu a uma autarquia municipal, o Departamento de Água e Esgoto de Ribeirão (Daerp), "total responsabilidade e autonomia" pela execução e fiscalização daquele serviço. Afirmou que jamais tomou dinheiro de fornecedores para abastecer caixa 2 de seu partido, acusação que repudiou por mais de uma vez.

O ex-ministro chegou ao prédio da Corregedoria da Polícia Civil do Distrito Federal escondido no interior de uma Nissan preta. Os vidros com película escura do carro importado e a generosidade da polícia o protegeram das câmaras de TV e dos fotógrafos. Ao sair usou a mesma estratégia.

O inquérito que aponta Palocci como mandante e mentor de fraudes na medição da varrição de ruas, esquema que teria provocado prejuízo de R$ 30,7 milhões ao Tesouro municipal, é presidido pelo delegado Benedito Antonio Valencise, da polícia de Ribeirão Preto. Foi Valencise quem decretou o indiciamento do ex-ministro. Por meio de uma carta precatória, que enviou à polícia de Brasília, ele traçou o roteiro do interrogatório, que foi seguido pelo delegado Amarildo Fernandes, da Delegacia de Capturas e Polícia Interestadual (Polinter) do DF.

ORGANIZAÇÃO

"Há suspeita de que isso (o esquema do lixo) era comandado por ele", declarou o promotor de Justiça Daniel José de Angelis, que integra o Grupo de Combate e Repressão ao Crime Organizado (Gaerco), braço do Ministério Público paulista em Ribeirão. Angelis acompanhou a audiência. O Ministério Público conduz 25 procedimentos de investigação sobre atos de Palocci enquanto prefeito de Ribeirão.

O promotor disse que "neste momento" não há necessidade de pedir à Justiça a prisão preventiva do ex-ministro, mas foi categórico ao comentar a suspeita de que o investigado teria sido decisivo para a consumação do peculato. "Uma organização que dá um prejuízo dessa monta em tese não passa despercebida do prefeito."

As digitais do ex-ministro podem estar na produção de falsos atestados de medição de áreas varridas que deram suporte a desembolsos irregulares. Os pagamentos teriam favorecido a empresa Leão Leão. Maior doadora da campanha eleitoral de Palocci em 2000, a Leão Leão foi contratada pelo Departamento de Água e Energia de Ribeirão Preto.

O promotor explicou o motivo do enquadramento de Palocci no delito de lavagem de dinheiro. "Significa dissimular a origem de determinado recurso. Esse dinheiro que teria vindo da Leão Leão teria sido dissimulado com as notas falsas." Angelis informou que outras investigações reforçam suspeitas da transferência de dinheiro ilegal para o PT.

"Neste inquérito (sobre o lixo) não conseguimos apurar, mas em outros existem evidências. Há o depoimento de Buratti (Rogério Buratti, advogado que foi assessor de Palocci e depois denunciou o mensalinho) e existem notas frias com saques no caixa da Leão Leão. Essas coisas existem, e a gente está prosseguindo", anotou o promotor. "Há também gravações telefônicas sugerindo (que dinheiro ia para o PT)."

PAPÉIS

Angelis declarou que vai buscar outras provas e verificar documentos que o ex-ministro disse que existem - papéis que, segundo Palocci, dão amparo à sua versão de inocência. "O Daerp tinha total autonomia para cuidar da execução do contrato, eu não sabia de nada", reiterou Palocci.

O próximo alvo da polícia se chama Isabel Bordini, ex-superintendente do Daerp, que será intimada. Se ela desmentir o ex-ministro, o Ministério Público vai pedir uma acareação entre ambos. "A impressão que eu tive é de que ele quis livrar a dele dizendo que o Daerp tinha total autonomia", avalia o promotor Angelis.

"Se Isabel confirmar que tinha autonomia, aí vamos seguir outra linha de investigação para verificar se ela realmente fez isso por conta própria. Mas os indícios são de que, a princípio, haveria participação de Palocci, de que ele era o mandante. Por isso foi indiciado."