Título: 'Exigências da Bolívia têm de ser razoáveis'
Autor: Jamil Chade
Fonte: O Estado de São Paulo, 29/04/2006, Economia & Negócios, p. B9

Celso Amorim, ministro de Relações Exteriores ENTREVISTA

O Itamaraty alerta que as exigências bolivianas nas negociações sobre o comércio de gás natural devem estar "dentro do razoável", caso contrário podem inviabilizar os investimentos brasileiros na Bolívia. Os dois países estão em negociações depois que o governo de La Paz passou a insistir em novas condições para a exportação do gás para o Brasil e em novas exigências para empresas brasileiras atuando no país. Em entrevista ao Estado, o chanceler Celso Amorim garantiu que o Brasil respeita a soberania boliviana, mas lembra que La Paz também se beneficia do comércio com o Brasil. A seguir, os principais trechos da entrevista:

O projeto de um gasoduto entre Brasil, Venezuela e Argentina gerou muita polêmica nos últimos dias com o governo boliviano. A que o sr. atribui os atritos na região? Houve muito mal-entendido nisso tudo. Os bolivianos sentiram que se tratava de uma alternativa. Não é isso. O projeto é complementar ao que existe entre o Brasil e a Bolívia. Entendemos que a Bolívia manterá um papel importante nesse cenário. Agora, há outras fontes e é bom que estejam conjugadas.

O presidente boliviano Evo Morales será consultado sobre o projeto? Vamos sondar a Bolívia sobre a possibilidade de participarem do gasoduto, um projeto maior.

Mas a idéia do governo é tentar não ficar dependente do gás da Bolívia? De qualquer maneira, teríamos outras alternativas. Mas nosso interesse com a Bolívia é mais que ter o gás. A Bolívia é o país que tem a maior fronteira com o Brasil. Agora, acho que a Bolívia também se beneficia. Podemos melhorar as condições? Sim, mas sempre dentro da razoabilidade que permita que os investimentos brasileiros sejam viáveis. Negociei parte do gasoduto entre o Brasil e a Bolívia no início dos anos 90 durante o governo de Itamar Franco e havia gente que até achava que não deveríamos fechar esse acordo. Mas optamos por isso como uma alternativa também para dar fôlego para a economia da Bolívia. E demos. Naquela época, nossas importações eram de apenas US$ 30 milhões, enquanto exportávamos US$ 300 milhões aos bolivianos. Hoje, importamos US$ 700 milhões. Isso foi uma mudança radical.

Uma das reivindicações da Bolívia é de que haja uma maior remuneração pelo gás exportado? É justo e vamos discutir. Mas precisamos ter presente sempre a razoabilidade. Chega um certo ponto que não tem condição. Não é questão de querer ou não querer. Não há condições. Tem que haver uma razoabilidade do que é uma remuneração justa e também do que é razoável para tornar viável o negócio. A partir de um certo ponto, não é mais viável. Não vai haver nem investimentos lá na Bolívia nem poderemos usar gás nas termoelétricas, pois ficaria tão mais caro que outras fontes que não compensaria.