Título: Agricultores mantêm protestos e já começa a faltar produtos
Autor: Carlos A. Fruet, Evandro Fadel e Nelson Francisco
Fonte: O Estado de São Paulo, 19/05/2006, Economia & Negócios, p. B16

Os bloqueios causados por protestos de agricultores continuam em diversos Estados e já começam a ameaçar o abastecimento de produtos em algumas regiões. Ontem, produtores de vários regiões decidiram manter os protestos. Em Mato Grosso, começam a faltar produtos nas prateleiras dos supermercados, como o óleo de soja.

Um dos incentivadores do movimento "Grito do Ipiranga", iniciado em 21 de abril, o governador e produtor de soja Blairo Maggi quer a suspensão das manifestações, que já afetam a arrecadação estadual. O movimento de cargas nas estradas caiu 50%. Em decorrência da crise no agronegócio, o Estado fechará o ano com um déficit de R$ 600 milhões nas contas públicas, afirmou Maggi.

O governador pediu aos presidentes de sindicatos rurais uma trégua ao governo federal nos bloqueios nas rodovias até a próxima quinta-feira, quando será anunciada a proposta da União aos pedidos de oito governadores, feito na terça-feira, para socorrer o setor agrícola.

"Peço este voto de confiança. Chegamos ao limite para o Estado não morrer sufocado. Reconheço a legitimidade do movimento, mas é hora de dar uma trégua", disse Maggi.

Apesar do apelo, os agricultores vão continuar mobilizados. A decisão foi tomada em reunião ocorrida ontem na Federação da Agricultura do Estado (Famato). "Não vamos recuar, apenas avançar na nossa estratégia. Devemos continuar com os bloqueios somente de carga para não perdermos o foco do movimento. Precisamos de idéias e criatividade até nas reivindicações", disse Rui Prado, presidente da Associação dos Produtores de Soja.

O protesto iniciado em Mato Grosso contra a política agrícola do governo teve adesão de agricultores em São Paulo, Bahia, Rio Grande do Sul, Paraná, Mato Grosso do Sul e Tocantins. "Esta é hora de sermos inteligentes, vamos dar uma trégua, mas continuar mobilizados", disse o presidente da Famato, Homero Pereira.

O s pecuaristas do Instituto Nacional de Defesa Agropecuária de Mato Grosso aderiram ao movimento e fecharam 51 escritórios desde segunda-feira. Esses escritórios liberam a carne das fazendas para o abate.

CARNE E LEITE

Já no Rio Grande do sul os bloqueios causam desabastecimento no interior do Estado. Desde o início dos protestos, na terça-feira, várias cidades gaúchas começam a sentir o reflexo das paralisações nas rodovias estaduais e federais, causando transtornos para comerciantes, viajantes, universitários e o trânsito em geral.

Em Carazinho, na Região do Alto Jacuí, no entroncamento das BRs 285 e 386, a juíza da 3.ª Vara Cível do município, Marlene de Souza, determinou a liberação do trecho para a passagem de ônibus, veículos dos Correios e caminhões com cargas perecíveis. Se a ordem não for cumprida, a Federação dos Trabalhadores na Agricultura (Fetag), o Sindicato Rural e o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Carazinho, que são os responsáveis pelos protestos, terão de pagar multa diária de R$ 30 mil.

Em São Luiz Gonzaga, na Região das Missões, o trevo de acesso à cidade, na BR-285 com a RS-168, também se encontra bloqueado, e o comércio local fechou as portas.

O vice-presidente da Associação do Comércio e Indústria do município, Amauri Feron, está preocupado com a situação: "Se continuar assim, corremos o risco de ter o desabastecimento de gás de cozinha, leite longa-vida, carne bovina e hortigranjeiros."

O leite e seus derivados também podem faltar, diz o presidente do Sindicato dos Produtores de Leite no Estado, Jones Raguzzoni: "Há caminhões com leite parados há mais de 24 horas. Vai estragar o produto e, como estamos na entressafra, corremos o risco de desabastecimento", alertou.

No Paraná, o presidente do Sindicato Rural de Maringá, José Antonio Borghi, disse que a orientação é para que os bloqueios provoquem o mínimo de prejuízo para a população. Por isso, manifestantes têm permitido a passagem de carros pequenos no mínimo a cada uma hora.

De acordo com a Polícia Rodoviária Estadual, ontem foram registrados 30 bloqueios no Estado. No fim da tarde, a maioria estava sendo desfeita, pois os agricultores têm liberado as rodovias à noite, voltando a protestar de manhã.