Título: Descontrole afasta novos investimentos
Autor: Lu Aiko Otta
Fonte: O Estado de São Paulo, 30/04/2006, Economia & Negócios, p. B8

Lógica é que, se despesa não cai, impostos também não podem cair

Os aumentos sucessivos nos gastos incortáveis do governo afastam investimentos. "Qual é o empresário que vai querer investir num país com desequilíbrio estrutural em suas contas?", questionou o economista Joel Bogdanski, do Banco Itaú. A diretora da Federação do Comércio do Rio de Janeiro Clarice Messer observou que o crescimento das despesas com pessoal e custeio da máquina reduz a possibilidade de o governo investir. "Não é de espantar que os investimentos privados, que vêm a reboque dos públicos, caminhem a passo de tartaruga", disse.

O investidor vê esse quadro com desconfiança porque percebe que se a despesa do governo não cai, a receita também não poderá cair. "Não há perspectiva de redução da carga tributária", comentou Bogdanski. "Além disso, mostra que o País não está preparado para tempos mais difíceis."

Ele lembra que o Brasil "surfou na onda do crescimento mundial", mas não aproveitou os tempos de bonança para melhorar as bases da economia. "Vamos para o segundo ano consecutivo sem avanços significativos nas propostas de reforma econômica que estão no Congresso. Isso é ruim, porque vai dilapidando o capital institucional que foi construído nos últimos anos", disse.

O mais preocupante, na avaliação de Bogdanski, é a falta de convicção do governo de que é preciso fazer algo. Essa falta de convicção que há algo de errado na política de gastos pode ser resultado de uma avaliação de que, este ano, as contas deverão fechar dentro do esperado e a meta de economizar o equivalente a 4,25% do Produto Interno Bruto, o chamado superávit primário, será cumprida. "Eles vão empurrar com a barriga", avaliou.

Para o economista-chefe da corretora Convenção, Fernando Montero, o modelo de expansão de gastos do governo é algo que só se sustenta enquanto a economia e a arrecadação estão crescendo. De fato, o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, acha que o aumento das despesas com pessoal e custeio não é preocupante porque elas estão estáveis há alguns anos quando calculadas como proporção do PIB.

O problema é se o PIB cair, puxando para baixo a arrecadação. "Se a arrecadação cai, vai sobrar para quem?", questionou Montero. "Vão cortar investimentos. Ou então, seguram os investimentos das empresas estatais. Qualquer uma das opções é ruim para a economia."

Ele acredita que, este ano, a economia vai crescer perto de 4%, beneficiada pela queda dos juros, o dólar baixo e o crédito abundante. "É um choque de oferta positivo, mas esse quadro não se repetirá em 2007", afirmou. "Precisaremos ter algum tipo de ajuste fiscal no ano que vem."

Além de afastar investimentos por criar um quadro de insegurança nos agentes econômicos, a gastança federal tira a margem de manobra do governo diante de crises econômicas. Nesses momentos, as fontes de financiamento da dívida pública tendem a escassear, por isso é preciso cortar despesas ou aumentar a arrecadação ou uma combinação dessas duas coisas.

Mas o risco de uma crise afetar o Brasil, como no final dos anos 90, é mínimo porque, mesmo com o aumento dos gastos, as contas públicas ainda estão sob controle se avaliadas apenas sob o aspecto de cumprimento da meta fiscal. E outros aspectos da economia vão bem: a inflação está baixa, as contas externas têm bom desempenho, a vulnerabilidade do País no que se refere à dívida externa está praticamente eliminada. "Temos tanto fundamento econômico que não vamos ter crise", disse Montero.