Título: Gastança eleitoral é irreversível
Autor: Lu Aiko Otta
Fonte: O Estado de São Paulo, 30/04/2006, Economia & Negócios, p. B8

Aumentos de despesas concentram-se em itens como salários e benefícios, que não podem mais ser cortados

O presidente Lula está ampliando os gastos do governo de forma irreversível. Dados do Tesouro Nacional mostram que as despesas aumentaram 14,5% nos 3 primeiros meses do ano, não por causa de obras. O que está pesando sobre o caixa federal são os gastos com a Previdência e os programas assistenciais e também a folha de pagamentos do governo.

O problema, segundo economistas, é que esses gastos não são cortáveis e ficarão incorporados à estrutura de despesas nos próximos anos. Significa que tão cedo a carga tributária não poderá cair, ou não será possível pagar todas as despesas. E, na hipótese de haver uma crise internacional, haverá pouca margem de manobra para "apertar o cinto".

Dos R$ 11,3 bilhões de crescimento nas despesas nos primeiros 3 meses do ano, R$ 3,3 bilhões são gastos extras com salários dos funcionários públicos. São contratações e reajustes salariais, que atenderam a reivindicações das bases sindicalistas do governo.

Os funcionários públicos se queixam de terem passado os 8 anos do governo Fernando Henrique com os vencimentos congelados. Em contraste, é objetivo declarado do governo Lula terminar este ano tendo reajustado o salário de todos os servidores em pelo menos 29,65%, correspondentes à inflação dos 4 anos de seu mandato.

O aumento de 13% aos militares, concedido no ano passado, fez os gastos com a folha crescerem R$ 600 milhões só no primeiro trimestre. Mas em 2006 a despesa com a folha vai crescer R$ 700 milhões por causa do reajuste dos salários dos funcionários do chamado Plano de Cargos e Carreiras. Os trabalhadores de nível auxiliar terão aumento de 137,8%, os intermediários ganharão 89,3% a mais e os de nível superior, 67,4%.

Além disso, Lula autorizou a realização de concursos para contratar 60 mil funcionários para ministérios e agências reguladoras. Mas parte desses concursos está sendo realizada para cumprir determinação do Ministério Público do Trabalho, que mandou substituir pessoal terceirizado.

O que mais pesa no aumento dos gastos com o funcionalismo, porém, não são os funcionários do Poder Executivo. Dos R$ 3,3 bilhões de crescimento nas despesas de pessoal este ano, R$ 2 bilhões foram para o Legislativo e para o Judiciário - R$ 800 milhões para pagamento de decisões judiciais e R$ 1,2 bilhão decorrentes de reajustes salariais.

No caso dos funcionários do Congresso, o que provocou o salto nas despesas foi o reajuste de 15% concedido no ano passado. Lula tentou vetar esse aumento, mas não conseguiu. Outros R$ 400 milhões são gastos extras com os salários do Ministério Público.

E a conta tende a crescer. Está no Congresso um projeto de lei para reformulação das carreiras do Judiciário que custará R$ 4,5 bilhões. Essa, porém, é uma despesa que presidente nenhum conseguiu controlar. Há anos, a área econômica não consegue saber quanto ganha cada funcionário do Judiciário. O Tesouro só recebe a fatura e paga.

SALÁRIO MÍNIMO

Dos R$ 11,3 bilhões de gastos adicionais nos 3 primeiros meses do ano, R$ 4,4 bilhões decorrem do aumento do salário mínimo. Cada vez que o mínimo é reajustado, sobem as despesas com o pagamento de aposentadorias e pensões, o seguro-desemprego e os benefícios da Lei Orgânica da Assistência Social e o Renda Mensal Vitalícia, que garantem renda mínima a deficientes físicos e idosos que nunca contribuíram para o INSS.

No caso, os números ainda refletem o reajuste de R$ 260 para R$ 300 decidido no ano passado. A conta vai aumentar, porque o mínimo subiu para R$ 350 no dia 1.º de abril. Essa "bondade" de Lula significará uma conta extra de R$ 5,9 bilhões este ano. O Bolsa Família, consumiu R$ 400 milhões a mais este ano, em comparação com o primeiro trimestre de 2005.

"É espantoso", comentou o economista-chefe da corretora Convenção, Fernando Montero. Ele disse que as decisões de gasto aumentaram as despesas obrigatórias de tal forma que a proposta de Orçamento para 2006 chegou ao Congresso sem espaço para os deputados e senadores incluírem emendas.