Título: Promotoria investiga Furukawa
Autor: Laura Diniz e Marcelo Godoy
Fonte: O Estado de São Paulo, 19/05/2006, Metrópole, p. C6

O Ministério Público Estadual (MPE) abriu inquérito ontem para apurar eventual prática de improbidade administrativa por parte do secretário de Administração Penitenciária, Nagashi Furukawa. Ele será chamado a explicar, pessoalmente ou por escrito, a entrada de 28 aparelhos de TV na Penitenciária 1 de Avaré. Não havia nota fiscal da compra das televisões e todas foram enviadas pelo correio pelo mesmo remetente. Os destinatários eram líderes do Primeiro Comando da Capital (PCC). Na época, o líder máximo da organização criminosa, Marcos Willians Herbas Camacho, o Marcola, estava nessa penitenciária.

"O secretário reconheceu que autorizou a entrada dos televisores comprados pelos presos sem saber de onde veio o dinheiro para essa compra e sem questionar isso", disse o promotor da Cidadania Saad Mazloum, que instaurou o inquérito. A conduta, segundo Saad, dá indícios de que houve ofensa aos princípios da administração pública, "notadamente da legalidade, moralidade e lealdade às instituições, valores que devem nortear a conduta de todos os agentes públicos".

Caso o promotor conclua que houve improbidade, entrará com uma ação contra Nagashi. As punições possíveis são perda da função pública, suspensão dos direitos políticos, pagamento de multa, proibição de contratar com o Poder Público e receber benefícios ou incentivos fiscais.

Segundo o delegado-geral, Marco Antônio Desgualdo, a Polícia Civil também vai investigar a origem das TVs.

HISTÓRICO

O pedido dos presos para assistir à Copa do Mundo foi feito na Penitenciária 1 de Avaré em março. Lá compareceram dois altos funcionários da Secretaria da Administração Penitenciária que conversaram com o preso Orlando Mota Junior, o Macarrão, e com Julio Cesar Guedes de Moraes, o Julinho Carambola, dois dos líderes do PCC. Estes pediram o aumento do número de visitas que cada preso tem direito de receber, a troca da cor do uniforme de amarelo para cáqui e o direito de receber 60 TVs para ver os jogos da seleção brasileira.

Furukawa concordou com a troca da cor do uniforme, desde que sem ônus para o Estado. A justificativa para atender a esse pedido do crime organizado era a dificuldade das famílias dos presos de encontrarem calças amarelas em lojas para comprar para seus parentes - o Estado distribui duas para cada detento, mas os familiares podem adquirir outras.

Além disso, o secretário permitiu que as TVs entrassem nas penitenciárias e fossem instaladas em áreas comuns das prisões, as chamadas galerias, onde funcionariam como uma espécie de telão. Dois lotes de 14 aparelhos chegaram em Avaré por Sedex antes que os líderes do PCC fossem transferidos para a Penitenciária 2 de Presidente Venceslau. O restante ainda seria enviado.

Furukawa confessou anteontem que não sabia a origem ou quem havia comprado os aparelhos nem mesmo o tamanho de suas telas ou o tipo - por exemplo, se eles eram de plasma. "Não vi nada de mal (em autorizar), desde que não comprometa a segurança", afirmou.

Quando os líderes do PCC foram transferidos para Presidente Venceslau, as TVs ficaram em Avaré. Os líderes do PCC, que havia comprado os aparelhos dentro de sua política de conquistar a simpatia dos presos, ficaram contrariados, queriam seus televisores de volta e apresentaram a reivindicação ao governo, pois os chefes da facção não desistiram de assistir à Copa do Mundo.

DESGASTE

A revelação do episódio causou desgaste ao secretário. Apesar de o governador Claudio Lembo afirmar que ele permanece no cargo, o governo chegou a sondar possíveis substitutos de Furukawa, entre eles o deputado estadual Romeu Tuma Junior (PMDB).

Furukawa assumiu a secretaria em 1999, a convite do então governador Mário Covas. Sua experiência na racionalização de custos da administração e melhora da qualidade dos serviços prestados ao presos, quando era juiz em Bragança Paulista, credenciaram-no para o cargo. A implantação daquele modelo fez com ele fosse um dos poucos colaboradores de Covas que foram mantidos por Alckmin e, agora, por Lembo.

Desde o fim do ano passado, o secretário vem enfrentando uma briga pública com alguns integrantes da Polícia Civil, depois que um dos coordenadores da SAP foi preso e acusado de vender vagas para presos.

Após os ataques e rebeliões, Furukawa eximiu-se de culpa pelas ações do crime organizado, dizendo que o combate ao PCC cabe à polícia. "Não fui eu quem disse que o PCC havia perdido seus dentes", afirmou, numa referência ao delegado Godofredo Bittencourt Filho, diretor do Departamento Estadual de Investigações sobre o Crime Organizado (Deic).