Título: Lula chama reunião de emergência
Autor: Jamil Chade
Fonte: O Estado de São Paulo, 02/05/2006, Economia & Negócios, p. B3

Crise exigiu que o chanceler Celso Amorim abandonasse reunião em Genebra com representantes dos EUA

O presidente Lula tem hoje em Brasília uma reunião de emergência para tratar da decisão da Bolívia de nacionalizar os campos de petróleo e gás. As informações são do Itamaraty, que será representado no encontro pelo ministro interino das Relações Exteriores, Samuel Pinheiro Guimarães. A crise em La Paz exigiu que o chanceler Celso Amorim abandonasse uma reunião em Genebra com os mais altos representantes de Comércio dos Estados Unidos.

Amorim estava na Suíça para reuniões sobre a Organização Mundial do Comércio (OMC), mas decidiu antecipar o retorno ao Brasil para ontem diante da situação na Bolívia. A agenda inicial de Amorim previa reuniões hoje em Genebra com o G-20, grupo de países emergentes, com ministros do Japão e mais uma vez com os americanos.

O chanceler participava de um jantar na embaixada americana em Genebra quando soube dos eventos. O encontro era o primeiro entre o Brasil e a futura representante de Comércio da Casa Branca, Susan Schwab, e tinha como objetivo tentar superar as diferenças entre os países nas negociações comerciais em plena crise.

De manhã, antes do anúncio da nacionalização feito pelo presidente boliviano, Evo Morales, a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, defendeu em Nova York uma solução negociada com a Bolívia. "Acreditamos na soberania do país (Bolívia), mas também vemos com preocupação a preservação dos interesses do Brasil e, especificamente, da Petrobrás", afirmou em pronunciamento para investidores e analistas americanos. Dilma, que tinha nos próximos dois dias uma intensa agenda em Washington, cancelou todos os compromissos e antecipou sua volta.

Ao retornar à casa do embaixador brasileiro em Genebra, Amorim passou pelo menos 30 minutos ao telefone com o embaixador do Brasil em La Paz, Antonino Mena Gonçalves. Amorim ainda conversou com Samuel Pinheiro Guimarães, secretário-geral do Itamaraty, enviado na semana passada à Bolívia para tratar dos assuntos envolvendo petróleo e gás. Após as conversas, o chanceler ligou para Lula e relatou as informações que havia obtido.

Ficou estabelecido que o presidente convocaria uma reunião para as 11h de hoje com o ministro de Minas e Energia e o presidente da Petrobrás, além do ministro interino das Relações Exteriores. "O assunto está sendo considerado com a natural seriedade que se exige", afirmou Amorim por meio de sua assessoria. No Itamaraty, a convocação da reunião pelo presidente já é considerada uma mensagem aos bolivianos de que o Brasil tratará a situação com prioridade.

Sexta-feira, Amorim deu entrevista ao Estado na qual lembrou que as exigências da Bolívia precisavam estar "dentro do razoável" e que La Paz também estaria ganhando com as importações brasileiras e com os investimentos da Petrobrás. No Itamaraty, porém, o sentimento é de que, apesar da crise, um diálogo precisa ser mantido e a soberania boliviana terá de ser preservada.

A embaixada do Brasil na Bolívia informou que, tão logo obteve o texto do decreto, iniciou as avaliações dos impactos e das conseqüências da decisão. Uma posição oficial do governo brasileiro só será apresentada após a reunião de hoje.

De acordo com a embaixada brasileira, a medida não foi totalmente inesperada, já que um decreto regulamentando a nova Lei de Hidrocarbonetos havia sido anunciado para junho. Nas últimas semanas, funcionários do governo e da Petrobrás vinham tentando negociar essa regulamentação com o governo boliviano.

Até o início da noite de ontem, a embaixada em La Paz não conhecia os detalhes do decreto nem o que ele vai significar de fato para a comercialização do gás natural. Antes de assinar o decreto, o governo Evo não procurou as autoridades brasileiras no país.