Título: Evo começa 'refundar' a Bolívia pela YPFB
Autor: Roberto Lameirinhas
Fonte: O Estado de São Paulo, 03/05/2006, Economia & Negócios, p. B9

Evo Morales foi eleito em dezembro do ano passado com um projeto político genérico, de "refundar a Bolívia", e duas promessas específicas, tirar da ilegalidade o cultivo da folha de coca e nacionalizar os recursos naturais do país - um processo para o qual seria imprescindível a recuperação da estatal Yacimientos Petrolíferos Fiscales de Bolívia (YPFB). A primeira promessa, ele cumpriu nas primeiras semanas de seu governo, pondo fim às limitações do plantio da coca. A segunda, está em processo de concretização, com o decreto que dá à YPFB amplo controle sobre a produção dos hidrocarbonetos.

A YPFB era, até segunda-feira, praticamente uma empresa fantasma. Desde 1997, quando vendeu as duas últimas refinarias de petróleo que controlava à argentina Pérez Companc - depois, elas passaram às mãos da Petrobrás -, sua única função era administrar os contratos de risco firmados entre o governo e as petroleiras estrangeiras. A empresa, hoje, não tem nem engenheiros suficientes.

Com o decreto de nacionalização, a hoje "YPFB residual" ganha nova oportunidade de renascer. O texto da lei estabelece que, além dos 32% de imposto direto e dos 18% de royalties que ficarão com o Estado boliviano, outros 32% dos lucros da produção serão destinados à recapitalização e recapacitação da estatal. Apenas 18% ficarão para as empresas estrangeiras que concordarem em permanecer na Bolívia.

Ontem, a porta-voz da empresa Glória Yzaguirre assegurava que em poucos dias a YPFB estaria capacitada para suas novas funções. Evo quer a YPFB capacitada para atuar no mercado internacional, e várias vezes citou como exemplos a Petrobrás e a Petróleos de Venezuela (PDVSA). Por enquanto, está muito longe disso.

A empresa surgiu em 1936, logo após a Guerra do Chaco - no qual bolivianos e paraguaios disputaram uma área rica em petróleo e gás -, para operar as instalações confiscadas da americana Standard Oil Company por Germán Busch. Ganhou impulso em 1969, após uma nova nacionalização, quando o general Alfredo Ovando expropriou as concessões da também americana Gulf Company. Um detalhe que vem sendo discutido na Bolívia: a nacionalização de Evo é a terceira da história do país - e as duas primeiras se deram sob regimes ditatoriais.