Título: Investidores temem onda nacionalista na região
Autor: Cleide Silva
Fonte: O Estado de São Paulo, 03/05/2006, Economia & Negócios, p. B6

A estatização da indústria de gás e petróleo da Bolívia pode sinalizar o início de uma tendência em países governados por partidos de esquerda de forte tom nacionalista - na qual a América Latina se destaca. O alerta é de analistas estrangeiros, para quem essa tendência pode afastar investidores e criar outro fator de incerteza e de pressão sobre o preço das commodities.

"A decisão da Bolívia pode levar os investidores do setor de gás e petróleo a ficar mais cautelosos na região", disse Mohammad-Ali Zeiny, analista do Centre for Global Energy Studies de Londres. "Eles vão temer com mais intensidade que o que está acontecendo na Bolívia, e também na Venezuela,vire moda em outros lugares." Esse fator medo, acrescentou, será estimulado pelos altos preços do petróleo e gás, que elevaram a arrecadação dos países produtores.

O temor de uma "onda esquerdista" ou "populista" na América Latina entre os investidores estrangeiros vem aumentando nos últimos meses, diante da crescente influência do presidente Hugo Chávez, da Venezuela, na região e a eleição de Morales na Bolívia. O receio foi reforçado pela vitória no mês passado de Ollanta Humala no Peru e pela boa posição nas pesquisas eleitorais do México de Lopez Obrador, ex-prefeito da capital mexicana.

Néstor Kirchner, presidente argentino, é visto como versão light dessa onda política. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva é sempre colocado como um contraponto a essa tendência, sendo qualificado pela imprensa e bancos estrangeiros como principal representante "esquerda responsável" da América Latina, pois manteve políticas econômicas ortodoxas e consideradas pró-mercado.

"Se os investimentos em países produtores importantes declinarem por uma onda estatizante, isso obviamente pode ter impacto sobre os preços, pois sinalizará uma redução na produção prevista para o futuro", disse Zeiny.

Até agora, o impacto da nacionalização boliviana sobre as ações das empresas estrangeiras com ativos no país foi muito limitado. No longo prazo, diz Robert Plummer, especialista em investimentos de empresas petrolíferas da Wood Mackenzie, o impacto negativo sobre as empresas que investiram no país pode ser mais relevante. "Boa parte dos investimentos das empresa vislumbrava o uso das reservas de gás."