Título: Governo instala fábrica de chips em Porto Alegre
Autor: Alexandra Penhalver, Renato Cruz
Fonte: O Estado de São Paulo, 14/05/2006, Economia & Negócios, p. B16

Financiada pelo Ministério da Ciência e Tecnologia, será a primeira com ciclo completo de produção

Enquanto não consegue arrancar a fábrica de semicondutores de algum grupo estrangeiro nas conversas sobre TV digital, o governo banca a construção de uma unidade fabril em Porto Alegre. Quando começar a produzir (a previsão é o segundo semestre de 2006), será a primeira fábrica com o ciclo completo de produção de chips no País. Ela produzirá o componente desde o começo, a placa de silício, também chamada de wafer, que depois é cortada e encapsulada .

O Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT) financia a construção do Centro de Excelência em Tecnologia Eletrônica (Ceitec), contratada por R$ 149 milhões em licitação pública. O governo espera que a fábrica se torne o embrião de um pólo tecnológico para produção de componentes e formação de mão-de-obra especializada para o mercado eletroeletrônico e da TV digital. A Racional Engenharia lidera o consórcio vencedor da concorrência. A construção começou mês passado.

As máquinas foram doadas pela Motorola e o terreno pelo governo do Rio Grande do Sul. O investimento total no Ceitec deve chegar a R$ 180 milhões. Uma parte do projeto, o centro de design de semicondutores, já está pronta e em funcionamento. "Na América Latina não temos nenhuma fábrica de ciclo completo", afirmou Sérgio Dias, diretor-presidente do Ceitec. Quando operar em sua capacidade máxima, a fábrica deve ser capaz de produzir 4 mil wafers por mês. De acordo com o executivo, o faturamento anual deve chegar a R$ 12 milhões em 2011, o que cobriria os custos operacionais do centro.

Mas, se está sendo construído o Ceitec, por que o governo quer trazer uma fábrica de semicondutores com a TV digital? Ano passado, o Brasil importou US$ 2,904 bilhões em semicondutores. A capacidade de produção em Porto Alegre será muito pequena diante do tamanho do problema.

"Do ponto de vista industrial, o Ceitec não seria competitivo frente aos grandes fabricantes", reconheceu Henrique de Oliveira Miguel, coordenador geral de Microeletrônica do MCT. Segundo ele, o objetivo não é esse. O projeto foi criado em 2001. O Ceitec ajuda a criar mão-de-obra especializada em semicondutores e a dominar a tecnologia. A fábrica pode produzir protótipos para o centro de design e pequenos lotes de componentes, para necessidades específicas. "Não podemos depender sempre de consultoria e treinamento externos", afirmou Miguel.

Em março, a americana Smart Modular Technologies inaugurou uma fábrica de memórias de computadores em Atibaia (SP), com investimento de US$ 15 milhões. A unidade faz o encapsulamento, e importa os wafers de silício. Nas negociações da TV digital, o governo colocou a instalação de uma fábrica de semicondutores no País como uma contrapartida necessária para a escolha de um padrão estrangeiro. Até agora, não obteve compromisso firme de nenhum grupo internacional. Uma delegação da japonesa Toshiba visitou recentemente o Brasil, para avaliar as condições para o investimento.

"Uma grande fábrica viria ao Brasil se fosse para produzir para o mundo", afirmou o diretor de Componentes da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee), Wanderley Marzano. Para ele, o Ceitec é um projeto importante, mas não seria fator de atração dessa fábrica. "A minha preocupação é que a direção do Ceitec seja profissional, de gente da área, que conhece o mercado."