Título: Pesca predatória sai, entra negócio rentável
Autor: Roldão Arruda
Fonte: O Estado de São Paulo, 14/05/2006, Nacional, p. A14,15

Criação de pirarucu vira forma de sustentação dos ribeirinhos com uso adequado dos recursos naturais

Nesta época do ano, a Reserva Sustentável do Piranha, em Manacapuru, no Amazonas, está coberta pelas águas. So é possível chegar nela de barco e por toda parte avistam-se bandos de garças, mergulhões, marrecos, patos selvagens. A pesca é abundante. Os rios e lagos estão cheios de pirarucu, tambaqui, tucunaré, cará-açu, curimatã, matrinxã, piranha. Também tem jacaré e sucuriju, cobra que vive na água e é muito temida, porque, além de peixes e aves selvagens, costuma atacar galinhas, porcos e até crianças pequenas.

Do ponto de vista administrativo, a reserva tende a se tornar exemplo para outras regiões amazônicas. Situada a quase uma centena de quilômetros de Manaus, ela foi uma das primeiras no País a serem criadas por iniciativa de uma prefeitura.

Isso aconteceu em 1997, quando se descobriu que a pesca predatória estava ameaçando o ecossistema do Rio Piranha e a sobrevivência das famílias, cujo principal alimento é o peixe - que se come frito, cozido, assado, em caldeirada, misturado com farinha, feijão, arroz, milho.

Diante da ameaça ambiental, o então prefeito de Manacapuru, Angelus Figueira (PV), transformou a área de 103 mil hectares, com 84 famílias, em reserva sustentável. A idéia enfrentou resistência entre os moradores, porque, ao mesmo tempo que lamentavam o fim dos peixes, temiam o afastamento dos pescadores profissionais, para os quais prestavam serviços.

Para convencê-los, o prefeito transformou-os em fiscais ambientais, pagando um salário mínimo por família. Deu certo. Os moradores se organizaram em torno de uma associação para afastar os predadores, os peixes voltaram e a região começa a atrair investimentos na área do ecoturismo.

O desafio dos moradores agora é outro: encontrar formas de sustentação econômica com o manejo adequado dos recursos naturais. Há vários projetos em andamento na reserva. O que se encontra em estado mais avançado é a criação de pirarucus em cativeiro, com financiamento do Banco da Amazônia.

Cada família emprestou R$ 18.800, comprou o equipamento necessário e hoje cria pirarucu em cercados de arame que ficam dentro d'água, ligados às casas flutuantes. São dez tanques por família.

Para alimentar o pirarucu, que é carnívoro, os criadores pescam peixes menores, o que não é difícil. Basta estender a rede e esperar no máximo quinze minutos para começar a recolher.

LUCRO

Na região é comum pescar pirarucus de 80 quilos. Mas no cativeiro o recomendável é vendê-los na faixa dos 10 quilos. Depois disso aumenta o risco de arrebentarem as redes dos tanques e fica mais difícil alimentá-los. "Quanto maior, mais come, mais gastos dá - o que significa redução da margem de lucro do criador", diz o presidente da associação, João Barbosa da Silva, já falando como microempresário.

O projeto começou no ano passado e as primeiras levas de peixes devem ser comercializadas no segundo semestre. Um frigorífico já se ofereceu para comprar a produção da reserva, pagando R$ 10 pelo quilo de peixe. No conjunto, em valores brutos, dá para liquidar o financiamento com a primeira venda da família.

Agora, a associação de moradores aguarda uma licença do Ibama para começar a tocar o manejo de jacaré, cujo mercado é considerado melhor que o do peixe.