Título: 'As punições vão crescer consideravelmente'
Autor: Marcelo de Moraes, Diego Escosteguy
Fonte: O Estado de São Paulo, 28/05/2006, Nacional, p. A7

O ministro interino da Controladoria-Geral da União (CGU), Jorge Hage, acredita que os números do Banco de Punições relativos aos servidores públicos vão se multiplicar nos próximos anos. O motivo está na criação de um sistema que alocou um corregedor da CGU em cada órgão da administração direta e nos investimentos para qualificar os técnicos de controle do governo.

Nesta entrevista ao Estado, ele defende as estratégias de combate à corrupção do governo Lula, dispara contra os tucanos e critica a prática da administração petista de lotear cargos estratégicos entre partidos da base aliada.

O Banco de Punições apresenta cerca de 1.500 casos nos últimos cinco anos. Como aumentar o número de punidos?

Faltava fazer o que nós iniciamos. Construir um sistema de órgãos para prevenir, investigar e punir a corrupção, uma coisa que não tínhamos. É inédito na história do Brasil. Esse sistema está sendo considerado pela ONU um potencial modelo para a América Latina.

Esse sistema vai diminuir o surgimento de novos esquemas de corrupção no governo federal?

Se houver a continuidade desse modelo, seja qual for o próximo governo, se também houver por parte da imprensa a mesma cobrança que está acontecendo agora, não tenho a menor dúvida de que as punições vão crescer consideravelmente. O sucesso de tudo isso não depende só da CGU mas da interlocução entre os órgãos de investigação e controle. Por isso temos uma parceria íntima com a Polícia Federal, com resultados concretos em mais de 20 operações.

Mas por que não houve êxito no caso do mensalão, quando esses órgãos falharam?

Não é que eles tenham falhado: esse sistema não existia anteriormente. Tudo isso que foi descoberto agora está aí há 500 anos. Ou alguém tem dúvida disso? Só dois fatores podem causar surpresa diante de tudo que aconteceu: ingenuidade ou cinismo.

A surpresa aconteceu porque o esquema foi comandado pelo núcleo de um partido que prezava pela ética na administração pública. Que sempre houve corrupção ninguém discute.

Acharam que isso não ia acontecer no governo do PT. Mas a diferença é que no governo do PT passou-se a investigar e a se evidenciar tudo que estava aí. Não existe um único caso em nenhuma das auditorias em que a corrupção num órgão tenha começado neste governo. Todos vêm lá de trás. Um exemplo são os Correios. Os contratos de franquia, de carga, vêm de 1998, 1999. Furnas, lá em Minas, por exemplo. Dimas (Toledo, ex-diretor de Engenharia da estatal investigado pela PF) é tucano carimbado na testa. Todo mundo neste país sabe. IRB (Instituto de Resseguros do Brasil) é histórico, tentou-se de tudo para resolver o problema de lá.

O que não quer dizer que o fato de não ter começado agora minimize o que está acontecendo. O que choca é a corrupção organizada como projeto de poder de um grupo político.

Sem dúvida. Mas o que diferencia é o fato de que se está investigando. Há liberdade para a CGU atuar. O governo Lula deu recursos e autonomia num grau que a PF nunca teve antes.

Mas o mensalão veio à tona por causa do trabalho da imprensa e de brigas políticas entre grupos da base aliada, e não por causa da PF ou dos órgãos de controle.

S em dúvida. A imprensa tem papel fundamental nisso. O que eu espero é que a imprensa continue nessa postura de cobrança inédita. Torço que prossiga assim, nos próximos governos, ainda que depois de 2010, porque, ao que tudo indica, até lá será Lula .

O senhor cita a liberdade que o governo Lula concedeu à CGU e à PF, mas o mesmo governo mantém a prática da nomeação política em cargos que costumam servir para fazer caixa de campanha.

Concordo. Todos os avanços são inéditos, mas, na base, existem coisas que precisam ser mexidas. A primeira: financiamento de campanha. Sou favorável ao financiamento público. Segundo problema: a livre nomeação de cargos de confiança. Defendo a redução dos cargos de livre nomeação.