Título: Vinculação de verba vai elevar gasto em R$ 1 bi
Autor: Lisandra Paraguassú
Fonte: O Estado de São Paulo, 14/05/2006, Nacional, p. A4

Especialistas criticam aumento de gastos com ensino superior

Para os críticos da reforma universitária do governo Luiz Inácio Lula da Silva, um dos maiores problemas do projeto é a subvinculação de 75% das receitas federais de educação para aplicação no ensino superior, excluindo-se os inativos do orçamento das universidades federais. O próprio governo calcula que a combinação daquelas duas medidas vai aumentar em cerca de R$ 1 bilhão o custeio das universidades.

A área econômica resistiu o quanto pôde à proposta de reforma universitária, de olho especialmente nas implicações fiscais do aumento de gastos em um setor conhecido pela ineficiência e má gestão dos recursos públicos. Mas a vontade política do ministro das Relações Institucionais, Tarso Genro, prevaleceu.

"Eu acho (a subvinculação) uma total falta de eqüidade", diz Cláudio de Moura Castro, um dos maiores especialistas brasileiros em educação, com passagens pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), pelo Banco Mundial e pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento. Moura Castro observa que o ensino superior tem um custo por aluno mais de dez vezes maior do que o do fundamental. "Em um país em que o ensino superior tem custo de país rico, e o do ensino básico de país de Terceiro Mundo, o que está sendo proposto é tirar do pobrezinho que custa R$ 1 mil por ano e dar para o que custa R$ 15 mil", critica ele.

Para o economista Raul Velloso, especialista em contas públicas, "o problema é o aumento de gastos num momento em que tem de haver uma discussão sobre cortes". Ele nota que as universidades federais se caracterizam por combinar gratuidade para os usuários com má administração, ineficiência e empreguismo. "Esses problemas têm de ser resolvidos antes de se pensar em dar mais dinheiro", diz.

AVALIAÇÃO

Um aspecto positivo da última versão do projeto, porém, é o que determina que a distribuição dos recursos para as universidades federais seja feita de acordo com indicadores de qualidade. Uma das maiores críticas feitas às versões anteriores da reforma universitária era justamente a de que o aumento dos recursos para o ensino superior federal viria desacompanhado de um sistema de incentivos que melhorasse a qualidade de sua utilização.

Agora, de acordo com o novo projeto, a distribuição dos recursos vai levar em conta parâmetros como número de matrículas, registro de patentes, resultados na avaliação, etc. "Vincular os recursos à avaliação é bom", aprova o ex-ministro da Educação Paulo Renato, duro crítico da política educacional do governo Lula. Ele não concorda, porém, com o aumento do repasse de dinheiro para as universidades federais. "Eu tentaria o aumento de eficiência com os mesmos recursos; mais dinheiro para a educação sempre é bom, mas, como o orçamento é finito, é óbvio que isso vai tirar do ensino básico."

Moura Castro considera que um sistema de incentivos é "altamente positivo", mas ressalva que é arriscado colocá-lo na lei. "Se o sistema é fixado em lei antes de ser testado, pode-se criar um Frankenstein." Ele nota que a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), que avalia cursos de pós-graduação e tem um papel central na distribuição de bolsas de estudo, "foi polida ao longo do tempo sem que houvesse uma lei". Por isso, continua, a Capes alcançou um padrão reconhecidamente eficiente de atuação.

Outro ponto polêmico da reforma é a exigência de que pelo menos 70% do capital votante das entidades mantenedoras pertençam a brasileiros natos ou naturalizados. " É uma bobagem; o que interessa é que as instituições sigam as leis brasileiras", critica Paulo Renato. Para ele, "empresas internacionais que investem em educação podem ser mais eficientes e trazer métodos novos de gestão e docência".

Tanto Paulo Renato quanto Moura Castro manifestam grande preocupação quanto aos diversos pontos da reforma que aumentam o poder de estudantes e funcionários, em detrimento dos professores e reitores, o que, para eles, deve aumentar o corporativismo. "Isso transforma em disputa política o preenchimento de cargos, de reitores a chefes de departamento, levando os candidatos a venderem a alma para o diabo", ataca Moura Castro.