Título: Brasil admite negociação ampla
Autor: Wilson Tosta, Nilson Brandão Junior
Fonte: O Estado de São Paulo, 18/05/2006, Economia & Negócios, p. B6

Para assessor do governo Lula, Brasil pode discutir mudanças no contrato com a Bolívia

O assessor especial da Presidência para Assuntos Internacionais, Marco Aurélio Garcia, afirmou ontem que o Brasil está disposto a renegociar o preço do gás que compra da Bolívia além das atuais regras contratuais, desde que dentro de um acordo global e não separadamente. Segundo ele, o reajuste do produto está submetido a regras contratuais, mas o Brasil está aberto a discutir mudanças no texto.Ele destacou que brasileiros e bolivianos, no caso, são mutuamente dependentes. O assessor também lamentou que um acordo com os adeptos do presidente Evo Morales ainda antes da sua eleição - o de não negociar pela imprensa -, não tenha sido cumprido pelo país vizinho, cujas autoridades têm atacado o Brasil pelos jornais.

"Estamos dispostos a discutir mais além dessas regras contratuais, desde que isso se dê na base de um acordo global. Isso não é uma coisa que se negocia uma cláusula separada da outra", afirmou Marco Aurélio, que participou ontem do 18º Fórum Nacional, promovido pelo Instituto Nacional de Altos Estudos (Inae) no Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), no Rio. Segundo ele, o preço do gás é regulado por uma cesta de óleos, critério adotado no atual contrato.

"Muito bem, além disso os bolivianos querem introduzir outras mudanças no texto? Vamos discutir. Tudo está sob discussão." Marco Aurélio disse que "passados esses excessos verbais aí da parte de algumas autoridades bolivianas, se restabeleceu um clima de confiança", e as negociações serão presididas por um critério básico: os dois países dependem um do outro. "Vamos ter claro isto: se a Bolívia não vender o gás para o Brasil, ela não tem materialmente para quem vender." O assessor também citou a disposição do presidente Lula de fazer investimentos importantes no país vizinho, como um pólo gasoquímico que seria importante para a Bolívia aumentar o valor agregado de suas exportações.

"Se derem garantias, por que não?" O presidente da Petrobrás, José Sérgio Gabrielli, já declarou que a estatal cancelou seus planos de investimento na Bolívia. "Não ponho mais um tostão", disse Gabrielli.

Em suas intervenções no 18º Fórum, o assessor disse que Argentina e Brasil são o "eixo prioritário" da construção de uma política sul-americana, pelo peso e pelo espaço demográfico, político e cultural dos dois países. Segundo ele, isso não exclui outros países, como a Venezuela. "É importante não só pelo peso econômico, mas porque essa associação dará à atuação da Venezuela uma estabilidade necessária para a região. Eu prefiro a Venezuela aliada ao Brasil, à Argentina, ao Chile, do que solta, fazendo a sua própria política."

Na sua apresentação, Marco Aurélio havia indicado antes que a região deveria olhar de forma "muito sábia" para a solução da construção da União Européia, na qual se formou um eixo, inicialmente com Alemanha e França, não ficando apenas um país como líder. Antes, o embaixador Marcos Azambuja havia criticado a posição do Brasil, como sendo uma "locomotiva que não se locomove". "A locomotiva pode se locomover, mas ela tem de fazer sem barulho", retrucou Marco Aurélio.