Título: Terras sem escritura serão tomadas
Autor: Denise Chrispim Marin, João Caminoto
Fonte: O Estado de São Paulo, 13/05/2006, Economia & Negócios, p. B4,5

Informação foi confirmada pelo ministro boliviano do Planejamento e atinge todos os estrangeiros no país

Os brasileiros e outros estrangeiros que não tiverem comprovante da compra de terras na Bolívia serão obrigados a entregá-las ao governo, que as distribuirá às comunidades indígenas do país.

A informação foi confirmada ontem à BBC Brasil pelo ministro de Planejamento, Carlos Villegas. Ele disse que detalhes da nova reforma agrária boliviana serão divulgados no fim deste mês ou no início de junho.

Segundo Villegas, as medidas de "nacionalização" das terras e dos hidrocarbonetos bolivianos não devem causar surpresa ao Brasil ou a qualquer outro país. "Tenho certeza de que no Brasil não permitiriam a permanência de empresas e pessoas ilegais, que não respeitam a legislação brasileira. Se isso acontecesse, nos colocariam num avião e nos mandariam de volta para a Bolívia."

Para realizar a reforma agrária, o governo boliviano espera contar com créditos do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).

Mas ainda ontem, a Diretoria de Migração do Departamento de Pando, no norte da Bolívia, que tem Cobija como capital, informou desconhecer qual seria o destino dos brasileiros que forem expulsos das propriedades onde vivem. "Não há uma definição quanto ao destino das famílias que forem desalojadas a partir da determinação do Instituto Nacional de Reforma Agrária (Inra)", admitiu a assessoria jurídica da diretoria, Lourdes Loredo.

O órgão federal responsável pelo controle de estrangeiros no país estima que mais de 7 mil brasileiros vivem ilegalmente na faixa de fronteira, muitos têm pequenas propriedades ocupadas, em alguns casos, há mais de 20 anos. A maior parte vive da colheita de castanha nos períodos de dezembro a fevereiro e de roça de subsistência.

O governo Evo Morales determinou que o Inra faça cumprir o dispositivo constitucional que proíbe propriedade estrangeira na faixa de 50 quilômetros da fronteira. O dispositivo é preventivo. A Bolívia teme perder novas faixas territoriais. Isso ocorreu em séculos passados.

Uma parte do Departamento de Pando acusa o governo federal de deflagrar um processo migratório forçado na Bolívia. A idéia seria a de transferir índios da parte andina do país para as regiões de Pando, Beni, Santa Cruz e Tarija. Os quatro departamentos formam o bloco com aspirações separatistas e são conhecidos como a face oriental boliviana.

Por enquanto, a Diretoria de Migração não pretende adotar a estratégia do Inra responsável pela reforma agrária para lidar com o problema na fronteira. "Temos uma ação, eles têm outra. Somos órgãos diferentes", diz Lourdes. Ela garantiu que não está em estudo qualquer medida para notificar, expulsar ou deportar brasileiros. No dia 18, o órgão federal despachará grupos na fronteira para informar aos estrangeiros sobre a importância de regularizar a terra.