Título: Crise faz o Brasil correr atrás de gás
Autor: Nicola Pamplona
Fonte: O Estado de São Paulo, 07/05/2006, Economia & Negócios, p. B1

O Brasil tem potencial estimado em 880 bilhões de metros cúbicos de gás natural, o que garantiria o abastecimento do mercado atual por cerca de 50 anos. Mas a histórica falta de investimentos na procura do combustível faz com que a maior parte desse volume ainda não tenha sido explorada. Hoje, há só 300 bilhões de metros cúbicos comprovados no País, menos da metade das reservas da Bolívia, de 620 bilhões de metros cúbicos.

"Gás nós temos, mas está debaixo da terra", lamenta o coordenador da área de gás natural do Instituto Brasileiro do Petróleo (IBP), R. Fernandes. Especialistas lembram que a prioridade da Petrobrás sempre foi o petróleo, para garantir o abastecimento interno de combustíveis, deixando de lado, até a década passada, áreas com potencial de gás. "Gás nunca foi prioridade no Brasil", diz o geólogo Márcio Mello, da empresa de pesquisas HRT.

Mello e Fernandes acreditam que o clima atual de incerteza vai incentivar a busca de novas reservas. No mês passado, o governo decidiu que o próximo leilão de áreas exploratórias da Agência Nacional do Petróleo (ANP) terá "ênfase especial no potencial para a produção de gás natural", segundo resolução do Conselho Nacional de Política Energética, a exemplo do que ocorreu no leilão passado.

A própria Petrobrás vem revendo suas prioridades e decidiu antecipar ao máximo a produção em reservas recém-descobertas na região da Bacia de Campos, mesmo que isso signifique sacrifício no orçamento dos projetos. O problema é que, segundo estimativas do mercado, entre a descoberta de um campo e a primeira produção, há um período de maturação dos investimentos de sete a dez anos.

Fernandes lembra ainda que o desenvolvimento de reservas de gás demanda grandes investimentos, que não podem ser feitos apenas pela Petrobrás. A estatal sabe disso e negocia parcerias para desenvolver o Campo de Mexilhão, na Bacia de Santos, o mais avançado entre as novas descobertas. A expectativa é que a produção se inicie em 2008, com até 15 milhões de metros cúbicos por dia.

Mesmo assim, o País continuará dependendo de importações pelo menos até o final da próxima década. A ANP estima para 2010 um déficit de 7,2 milhões de metros cúbicos por dia, contando com os 30 milhões contratados com a Bolívia, caso as termoelétricas precisem ser acionadas - e os resultados dos últimos leilões de energia indicam que a energia térmica será fundamental para o abastecimento do País.

A ANP abriu processo de ampliação do Gasoduto Bolívia-Brasil para cobrir o rombo, mas, diante do cenário atual, a Petrobrás começa a avaliar alternativas, como a importação de gás natural liquefeito. Para Fernandes, essa seria a opção mais viável, já que existem fornecedores disponíveis no mercado e os investimentos podem ser feitos em até três anos.