Título: Dantas diz à Justiça que é vítima do MP e da imprensa
Autor: Rodrigo Pereira e Paulo Baraldi
Fonte: O Estado de São Paulo, 31/05/2006, Nacional, p. A9

O dono do Banco Opportunity, Daniel Dantas, não convenceu ontem, ao depor na 5ª Vara Criminal Federal em São Paulo. Nas cinco horas de depoimento, Dantas se limitou a responder apenas ao juiz Silvio Luis Ferreira da Rocha, desmerecendo as acusações das procuradoras da República Anamara Osório Silva de Sordi e Ana Carolina Yoshi Kano, autoras dos dois processos que o denunciam por crimes como formação de quadrilha e divulgação de segredo no chamado caso Kroll. Durante todo o tempo, o banqueiro se apresentou como vítima do Ministério Público Federal e da imprensa.

Dantas é acusado de contratar a agência de investigações Kroll para espionar executivos da Telecom Itália durante o processo de privatização da Brasil Telecom, a terceira maior empresa de telefonia fixa do Brasil. Nas investigações, a Polícia Federal e o Ministério Público concluíram que a Kroll fez escuta ilegal de conversas telefônicas de empresários, membros do governo federal e jornalistas. Além disso, teria se utilizado de servidores para obter informações sigilosas em bancos de dados da administração pública, que teriam sido utilizados para chantagear adversários.

Segundo a procuradora Anamara, Dantas teria dito à Justiça Federal que "o processo é um absurdo" e a repercussão do caso na imprensa estava sendo feita para prejudicá-lo. "Ele seria vítima dessa teia de conspiração", contou Anamara.

"Ele fala, fala, fala e não diz nada. Se diz vítima, mas não diz exatamente por quê", protestou ela. "Por quê? Quanto de dinheiro está envolvido nisso? Quanto vale o controle dele na Brasil Telecom?", questionou Anamara, lamentando o fato de não poder fazer essas perguntas diretamente a Dantas, que determinou no início da audiência que não responderia a nenhum questionamento do MPF ou dos advogados de acusação.

"Ele agiu como era o esperado de um réu em um depoimento", avaliou a assistente de acusação Maria Elizabeth Queijo, que foi contratada pelo jornalista Paulo Henrique Amorin e pelo ex-sócio de Daniel Dantas, Luis Roberto Demarco, para processar o banqueiro. "Ele negou todas as acusações. Admitiu que a Kroll foi contratada, mas pela Brasil Telecom, e não por ele. E que por isso não sabia das atividades da empresa", explicou Maria Elizabeth.

LINHA DE DEFESA

Anamara reclamou da linha de defesa de Dantas, que contestaria o levantamento de dados e a lógica da acusação, colocando-se como vítima de uma disputa comercial envolvendo o controle da Brasil Telecom. "E aí estariam todos: os órgãos de acusação, o Ministério Público Federal, a Polícia Federal, eventualmente o Poder Judiciário, estariam as vítimas, todos os desafetos dele", ironizou. "Ele diz que é vítima e conseqüentemente todos aqueles que estão contra ele são seus algozes."

O depoimento de Dantas ontem foi o último da primeira fase do processo do caso Kroll, de instrução dos réus. Entre o dia 3 de maio e ontem, 26 pessoas foram ouvidas pela Justiça, entre elas a ex-presidente da Brasil Telecom Carla Cicco, no dia 16. Apontada como braço direito de Dantas na operadora, Carla também negou o uso de interceptações telefônicas.

A Justiça Federal Cível espera a decisão da Justiça Criminal para analisar outro pedido do Ministério Público, o de dissolução da filial da Kroll no País.