Título: Petistas fazem pacto para tentar sair unidos da guerra da prévia
Autor: Mariana Caetano, Ana Paula Scinocca
Fonte: O Estado de São Paulo, 07/05/2006, Nacional, p. A4

Acordo prevê que Marta e Mercadante não contestarão resultado para evitar prejuízo ao plano de reeleição de Lula

Um pacto fechado entre a direção do PT, a ex-prefeita Marta Suplicy e o senador Aloizio Mercadante deve garantir que nenhum dos dois conteste o resultado da prévia que escolhe hoje o candidato do partido ao governo. São Paulo é peça-chave na corrida do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à reeleição e os petistas já trabalham para reconstruir a unidade do PT, após quatro meses de uma intensa guerra de bastidores, marcada por acusações de risco de fraude na votação, uso da máquina pública federal e de caixa 2.

A ordem é resolver impasses ou suspeitas antes do fechamento das urnas, às 17 horas, nos 524 municípios, de forma a impedir a formalização de recursos contra a apuração e evitar desgaste à imagem da legenda. Aliados dos dois candidatos prevêem vitória apertada, seja qual for o vencedor, com margem de até 2 mil votos para um quórum esperado de 80 mil eleitores. Não há favoritos. Marta aposta na vantagem que pode ter na capital; Mercadante, no interior e na Grande São Paulo.

"Acredito que deve ter maturidade partidária e uma correteza (sic) hoje que espero que dê a direção ao partido", afirmou a ex-prefeita, confiante "na unidade do PT" após a prévia. "Vou reconhecer qualquer resultado", disse Mercadante. "Apóio Marta se ela vencer, assim como sei que, se eu vencer, ela fará a mesma coisa. Nada de recurso." A primeira coisa que fará após a apuração, prometeu Marta, será ligar para pedir o apoio do rival ou se oferecer para atuar na sua campanha.

Toda a regulamentação da prévia foi negociada por consenso, ressalta o presidente do PT estadual, Paulo Frateschi. "Trabalhamos para que nenhum dos dois conteste a votação e isso está garantido." Foi eliminada a obrigatoriedade de o filiado quitar a contribuição anual ao partido antes de votar. A lista de filiados tem a chancela do diretório nacional e o transporte de eleitores foi liberado, desde que a direção seja informada. A cúpula do PT paulista e coordenadores dos dois concorrentes estarão de plantão no diretório. "Pode ocorrer uma ou outra contestação, mas a credibilidade do resultado não está em jogo", disse um dirigente. "Sabemos o que está em jogo".

SUSPEITAS

As feridas da campanha, porém, ainda estão abertas. Questionada se todos os petistas partilham da mesma "maturidade" e "correteza", Marta declarou que falava apenas por ela. "Não posso responder por todos."

Com reforço até de integrantes da corrente Articulação de Esquerda de outros Estados, a ex-prefeita manterá esquema especial de fiscalização em 160 cidades do interior. São principalmente municípios onde os resultados da última eleição interna do PT são postos sob suspeita, como revelou o Estado. "O quórum foi muito acima da média e quase a totalidade dos votos beneficiou Frateschi", diz um coordenador de campanha de Marta. "A urna foi levada até a casa de filiados ou a lista de presença foi assinada com antecedência." Em Apiaí, dos 24 filiados aptos a votar, 23 votaram e todos em Frateschi. Houve resultados parecidos em Catiguá e Embaúba, entre outras.

Como Frateschi defende Mercadante, o correligionário de Marta teme que o fenômeno se repita: "Podemos perder até 3 mil votos assim." O presidente do PT paulista nega as acusações, também rechaçadas pelos coordenadores do partido nas macrorregiões do Estado.

Do lado do senador, que tampouco dispensa a fiscalização, a suspeita recai sobre a capital, reduto da ex-prefeita. O diretório estadual arquivou recursos sobre denúncias de transporte irregular e pagamento antecipado da contribuição de eleitores em bairros da cidade.

Aliados de Mercadante espalharam boatos de uma "campanha milionária" de Marta, abastecida por caixa 2 supostamente arrecadado em seu mandato na Prefeitura. "Recebi da Marta oferta de apoio financeiro para a minha campanha", revelou um deputado das trincheiras do senador . "Inventam o que querem e às vezes dizem coisas que podem até prejudicá-los", reagiu Marta. Sua equipe não revela o custo da pré-campanha. A do senador também não.

O chumbo trocado inclui a atuação do presidente Lula a favor de Mercadante. Correligionários de Marta atribuem a adesão maciça de prefeitos ao senador à expectativa de liberação de verbas do governo. A ação de Lula, que publicamente nega preferência, foi decisiva para o deputado João Paulo Cunha e o prefeito de Osasco, Emídio de Souza, declararem apoio da região ao senador. A ex-prefeita nega preocupação, mas um de seus coordenadores avisa: "Se nos sentirmos lesados, vamos recorrer."

Feridas à parte, o curativo que os dois lados esperam está no Planalto. Uma vaga no ministério de um novo governo Lula.