Título: Ameaça de expulsão para 2 mil brasileiros
Autor: Denise Chrispim Marin
Fonte: O Estado de São Paulo, 23/05/2006, Economia & Negócios, p. B6

Posseiros não têm assegurado o direito de permanecer na Bolívia

O Brasil não conseguiu obter nenhuma garantia sólida do presidente da Bolívia, Evo Morales, de que os brasileiros em condições precárias de posse de terra poderão permanecer naquele país. Ontem, depois de negociar o tema com o próprio presidente, o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, ouviu seu colega David Choquehuanca afirmar claramente, diante da imprensa, que "os ilegais, sejam brasileiros ou bolivianos, terão de ser desalojados".

A referência não se estendeu aos brasileiros que cultivam soja na região próxima a Mato Grosso do Sul e que são responsáveis por cerca de 60% das exportações bolivianas dessa oleaginosa. Estes foram considerados publicamente pelo presidente como "meus amigos".

Mas a declaração de Choquehuanca soou como uma ameaça ao destino de cerca de 2 mil brasileiros que ultrapassaram a fronteira do Acre para a região do Pando, na Bolívia, trabalharam em atividades como coleta de castanhas e corte de madeiras e que se estabeleceram nos últimos anos como posseiros em terras de propriedade do governo boliviano - na faixa de 50 quilômetros da fronteira.

"Não ouvi a palavra 'expulsão do país' das autoridades bolivianas", rebateu imediatamente Amorim. "Não há conflitos, há questões que temos de resolver de forma construtiva."

Os resultados positivos dos encontros de ontem do chanceler brasileiro em La Paz, nesse sentido, foram a criação de dois grupos bilaterais de trabalho, um para monitorar as questões relativas à imigração e outro para a acompanhar os impactos da reforma agrária sobre a população brasileira na Bolívia.

ALERTA Amorim ressaltou que a Bolívia tem direito soberano de adotar uma nova fórmula para o setor agrário, mas garantiu que esses grupos permitirão um tratamento "humanitário e civilizado" e sem "arbitrariedades" aos brasileiros residentes naquele país.

O chanceler brasileiro fez, ainda, outro alerta ao governo de Evo Morales: o de que o Brasil está disposto a renovar, em setembro próximo, o acordo bilateral de regularização de imigrantes ilegais. Caso não haja tal renovação, La Paz está ciente que essa atitude poderá resultar em prejuízo à Bolívia, que mantém uma comunidade de cerca de 80 mil pessoas residentes no Brasil, entre os quais boa parte de forma ilegal.

Na Bolívia, a população brasileira é estimada em cerca de 7 mil pessoas.