Título: Aversão ao risco sacode mercados
Autor: Patrícia Campos Mello
Fonte: O Estado de São Paulo, 23/05/2006, Economia & Negócios, p. B1

O nervosismo tomou conta do mercado ontem, levando o dólar a fechar em R$ 2,28 no balcão, em alta de 3,67% (na roda, a alta foi de 4,17%), e o risco país, em 277 pontos, com elevação de 4,53%. Os dois indicadores atingiram o nível mais alto desde 19 de janeiro.

Com incertezas em relação ao ritmo de elevação dos juros americanos, os investidores estão tirando parte do capital dos países emergentes e aplicando sobretudo em títulos do Tesouro dos EUA, mais seguros. Mas o stress de ontem foi além dos mercados de países emergentes.

O Ibovespa fechou em baixa de 3,28%, a maior queda desde 18 de outubro de 2005. Em maio, a bolsa já teve uma queda de 9,58%, mas, no ano, ainda acumula alta de 9,09%. A Bolsa do México caiu 4,03%, maior perda desde setembro de 2002; a de Buenos Aires teve queda de 3,91%. As bolsas européias também caíram mais de 2% (a de Moscou desabou 9,1%), e o euro se desvalorizou ante o dólar.

Investidores acreditam que os juros americanos podem subir mais do que se esperava por causa de indícios de alta da inflação. Com isso, os investimentos em países ricos podem se tornar mais atraentes do que aplicações nos emergentes. Além disso, com juros mais elevados nos EUA, pode haver desaceleração na economia global - em busca de "proteção" em papéis mais seguros, os investidores migram para os títulos do Tesouro americano.

Desde 11 de maio, quando os investidores estrangeiros e, depois, os locais iniciaram o movimento de compra de dólares, a moeda americana acumula alta de 11,12%.

Para Alexandre Póvoa, sócio da Modal Asset Management, do ponto de vista de fundamentos econômicos, não há motivo para essa saída de ativos dos emergentes. Mas, do ponto de vista financeiro, entrou muito dinheiro nos países emergentes nos últimos anos; então, há muito espaço para realização de lucros. "Houve anos e anos de investimentos em países emergentes, portanto, nestes momentos, é mais que normal que os investidores saiam dos mercados arriscados", diz Póvoa. Na sexta-feira, os EUA vão divulgar o PCE (índice de gastos pessoais), acompanhado de perto pelo Fed. Até lá, é provável que o mercado continue muito volátil, acredita Póvoa.

Paulo Leme, diretor para Mercados Emergentes da Goldman Sachs, também acha que a volatilidade deve prosseguir esta semana. O economista acredita, porém, que o mercado deve estabilizar em duas a seis semanas. "Mas com uma maneira de operar diferente, com maior volatilidade e talvez com menor demanda por ativos de maiores riscos, nos quais incluímos os emergentes."

Já para Joaquim Elói Cirne de Toledo, professor da USP, não se trata de uma tendência de reversão dos fluxos para emergentes, mas de "um susto localizado".