Título: Nasce um problema
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Fonte: O Estado de São Paulo, 23/05/2006, Nacional, p. A6

O comando do partido quer fazer ver a Lembo que o adversário agora é Lula, não Alckmin

Ocupar o governo de São Paulo por oito meses inteiros sem ter sido necessário conquistar um voto para isso é solução para qualquer partido.

Para o PFL então, frágil em sua representação eleitoral no Sudeste, parecia a própria expressão do paraíso. Ainda mais que, junto com o governo, no pacote entregue pelos titulares tucanos estava também a prefeitura da maior cidade da América Latina.

É poder para político nenhum pôr defeito.

Mas o que parecia uma solução para o PFL equilibrar seu peso político na aliança com o PSDB e se firmar na condição de a mais intransigente força de oposição ao governo Luiz Inácio da Silva tornou-se um problema com o desempenho verbal do governador Cláudio Lembo, cheio de queixas e ironias dirigidas à cúpula tucana, principalmente aos candidatos Geraldo Alckmin e José Serra, por causa da falta da solidariedade na crise de segurança pública que assolou São Paulo na semana passada.

Ontem o comando do PFL, o presidente Jorge Bornhausen à frente, desembarcou em São Paulo disposto a fazer ver a Lembo, com muita delicadeza e uma dose substancial de firmeza, que o adversário principal chama-se Lula e que o projeto de conquista da Presidência da República não pode ser posto em risco por causa das atribulações administrativas e aflições emocionais de um governador.

Não seria uma ofensiva para enquadrar Cláudio Lembo nem chamá-lo às falas da disciplina partidária. Embora os espíritos estivessem imbuídos desta disposição, no PFL as coisas não acontecem assim de forma tão explícita e tampouco há interesse em fazer reparos públicos à conduta do governador, para não passar recibo ao adversário.

Para todos os efeitos, a cúpula - com a estratégica presença de Marco Maciel, a referência nacional de Lembo no PFL - esteve no Palácio dos Bandeirantes para "apresentar" o candidato a vice na chapa de Geraldo Alckmin, o senador José Jorge.

De acordo com a avaliação interna, as declarações de Cláudio Lembo têm um potencial muito mais negativo que o episódio dos ataques do crime organizado em si.

Não bastassem todos os percalços relativos à candidatura de Geraldo Alckmin e sua morna largada, o governador ainda criou um novo, abrindo ao adversário oportunidades de ataque, quando o PFL está preocupado em não baixar a guarda na sua condição de oposicionista. Lembo teve, assim, atuação oposta à linha do partido, cuja baixa aceitação a manifestações de autonomia é bem conhecida.

Os pefelistas acham que o governador exibiu fragilidade emocional, foi politicamente ingênuo e se preocupou mais com o apoio à sua posição de administrador da crise na segurança pública do que com o projeto nacional de retomada de poder.

Cláudio Lembo, político discreto e disciplinado, surpreendeu, e seu partido não gostaria de continuar se surpreendendo daqui para a frente e ao longo de toda a campanha presidencial, com o governador se transformando numa fonte permanente de tensão e risco no maior colégio eleitoral do País.