Título: TV digital ainda demora a chegar
Autor: Renato Cruz
Fonte: O Estado de São Paulo, 21/05/2006, Economia & Negócios, p. B17

Mesmo que o governo tome decisão até o fim do mês, consumidor terá acesso à tecnologia só em 2007

O governo espera decidir até o fim do mês sobre o padrão de TV digital a ser adotado no País. Ao que tudo indica, o vencedor será o japonês ISDB-T. Os europeus, com seu padrão DVB-T, ainda persistem (ver texto abaixo). Enquanto isto, as emissoras de televisão já preparam os próximos passos. Existem questões regulatórias, tecnológicas e industriais a serem resolvidas depois de o presidente Lula bater o martelo.

"Depois da definição, deve levar aproximadamente um ano para os receptores chegarem ao mercado", afirmou a diretora de Tecnologia de Transmissão da Rede Globo, Liliana Nakonechnyj. As fabricantes terão de preparar suas linhas de produção para a nova tecnologia; as emissoras receberão um novo canal, para transmitir em digital ao mesmo tempo que em analógico, e precisarão mudar os equipamentos de transmissão; e o governo, além de conceder novos canais, terá de definir as regras de transição e de operação, como o período em que cada emissora terá dois canais transmitindo simultaneamente e como funcionará a interatividade e a transmissão de múltiplos programas ao mesmo tempo, num único canal.

Para o consumidor sentir o gosto do que será a TV digital, a Rede Globo instalará, em cerca de 50 pontos no País, uma demonstração de televisão em alta definição, exibindo os jogos da Copa do Mundo. O formato da tela tem dimensões de 16:9 (mais larga, parecida com a de cinema); o número de linhas que formam a imagem chega a 1.080, mais que o dobro que na TV analógica; e o som tem 6 canais, no formato 5.1.

Não, ainda não se trata da TV aberta digital. "É importante deixar claro que não estamos passando por cima do governo, antes de ele tomar uma decisão", explicou Liliana. "A demonstração será feita num sistema fechado, via satélite, que não tem nada a ver com a TV aberta. A alta definição é somente um dos recursos da TV digital."

Inicialmente, a Globo pensou em fazer a demonstração em São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília. Agora, negocia para ampliá-la para outras cidades, como Belo Horizonte, Salvador, Porto Alegre, Curitiba, Campos do Jordão e Ribeirão Preto.

As televisões serão instaladas em locais públicos, como shopping centers. A rede de televisão terá como parceiros fabricantes de aparelhos de TV.

Quem já tem um televisor de alta definição não conseguirá assistir à demonstração em casa. A Irdeto forneceu um sistema de segurança, com criptografia e cartões inteligentes, para garantir que somente os decodificadores da Globo consigam abrir o sinal para os televisores. "Garantimos a proteção da transmissão", disse Giovani Henrique, diretor de Vendas para a América Latina da Irdeto.

Ironicamente, a transmissão da Globo usará um padrão europeu, o DVB-S, o mais adotado do mundo no satélite. "A modulação por satélite é completamente diferente da terrestre", afirmou Liliana. Para as transmissões terrestres, da TV aberta, a Globo e as demais emissoras defendem o padrão japonês ISDB-T.

Para Johnny Saad, presidente do Grupo Bandeirantes, a discussão sobre TV digital "começou muito mal", e os radiodifusores estavam alijados do processo. Ele atribuiu a correção de rumo à ação da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff. "A questão não é tecnológica", afirmou Saad. "Optamos pelo sistema de modulação japonês para deixar o governo livre para negociar."

Os radiodifusores acabaram encontrando eco à sua defesa do padrão japonês na Casa Civil e, desde o começo, nas Comunicações. Somente o ministro do Desenvolvimento, Luiz Fernando Furlan, parece não estar satisfeito com a opção.

O Brasil seria o único país, além do Japão, a usar o ISDB-T, o que poderia dificultar exportações de televisores.