Título: Obra de hidrelétrica é invadida por 500 índios
Autor: Luciana Garbin
Fonte: O Estado de São Paulo, 01/06/2006, Nacional, p. A11

Cerca de 500 índios do Parque do Xingu ocuparam na manhã de ontem as obras da Pequena Central Hidrelétrica Paranatinga 2, às margens do Rio Culuene, entre Paranatinga e Campinápolis, em Mato Grosso. Eles pedem a demolição da construção, que fica 120 quilômetros rio acima do parque e tem tirado o sono dos ambientalistas.

O local é sagrado para os índios - diz a mitologia que foi bem ali que o sol e a lua se juntaram, para celebrar o primeiro quarup, o ritual em homenagem aos mortos. Além disso, eles reclamam de degradação ambiental e temem uma redução drástica no nível do Culuene, principal afluente do Rio Xingu, dificultando o transporte fluvial e acabando com os peixes.

Segundo os manifestantes, alguns líderes assinaram termo de compromisso com a Paranatinga Energia S.A. e o governo de Mato Grosso sem saber do alcance da obra. Em troca, receberiam terras e dinheiro para projetos. Mas nem todas as etnias foram consultadas. "Essas pessoas assinaram sem ter conhecimento de nada", diz o líder Wulkai Suia.

Há outros problemas. Para ser construída, a usina foi licenciada pela Fundação Estadual do Meio Ambiente de Mato Grosso (Fema-MT), mas o Ministério Público Federal alega que a obra deveria ter sido submetida ao Ibama e à Funai, além de audiências públicas.

Os impasses levaram ao embargo da construção, no mês passado, mas os índios reclamam que a obra prosseguiu. Tanto que, na semana passada, o procurador da República Mário Lúcio de Avelar entrou com ação cautelar para paralisá-la.

A questão preocupa gente que há anos acompanha o Xingu. Como Noel Villas-Bôas, filho do sertanista Orlando. "Eles construíram a usina em tempo recorde e sem nenhuma publicidade. São 15 culturas que correm o risco de desaparecer. Assim como o Parque do Xingu, a vitrine da política indigenista brasileira", lamenta. Criada em 1961, a reserva de 2,64 milhões de hectares abriga 5 mil índios.

Em Cuiabá, o secretário estadual de Meio Ambiente de Mato Grosso, Marcos Machado, diz que a empresa responsável pela usina pretendia fazer um ajuste, mas que agora a questão está na Justiça. "Se, por determinação judicial, tivermos que fazer correções, serão feitas imediatamente." A secretaria foi criada em junho, em substituição à Fema, alvo de escândalos ligados a licenças ambientais.

Já a Paranatinga Energia informou que, a pedido do MPF e de outras entidades, está executando programa de gestão cultural e ambiental dividido em 17 subprogramas. Disse que o termo de compromisso assinado com índios prevê uma série de atividades e se dispôs a comprar um outro local sagrado dos índios, descoberto a oito quilômetros da usina, para doá-lo à União.