Título: Aracruz tenta superar ataque da Via Campesina
Autor: Elder Ogliari
Fonte: O Estado de São Paulo, 16/05/2006, Nacional, p. A9

Após 2 meses, laboratório no Sul foi reconstruído e pesquisadores retomam suas atividades

Dois meses depois de ser invadido e depredado por 2 mil mulheres da Via Campesina, o laboratório e viveiro da Aracruz Celulose em Barra do Ribeiro (RS) não guarda mais quase nenhum sinal da violenta madrugada de 8 de março. Todas as atividades de pesquisa, produção e expedição de mudas foram retomadas, assim como as obras de ampliação das instalações, que passarão ainda neste ano de 32 mil metros quadrados para 68 mil metros quadrados de estufas, investimento de R$ 17 milhões.

Transformada no símbolo da desolação que tomou conta dos funcionários da empresa, pelo choro incontido no dia da destruição, a analista de laboratório Isabel Gonçalves diz que chegou a ficar desiludida, mas retomou o ânimo ao perceber que a maioria da população não foi solidária às agressoras. "Quando vejo o trabalho dando frutos de novo esqueço o lado nebuloso de alguns seres humanos."

É no laboratório onde ela trabalha, há 19 anos, que ainda podem ser vistas marcas da destruição, como paredes e mesas com sinais de pauladas. A substituição de equipamentos como computadores, além de portas e janelas, custou US$ 400 mil.

Há, porém, mais valores a serem calculados. É numa estufa denominada pomar de hibridação em que ocorreram os maiores estragos, ainda não mensurados. No local, a empresa Sertel Serviços Técnicos Florestais Ltda. desenvolve espécies de maior capacidade de produção de fibra para celulose, o que é feito por cruzamentos, por meio da polinização controlada. O lugar é isolado, para barrar insetos e o vento.

PERDAS

Como os invasores cortaram lonas, arrancaram plantas e misturaram sementes, muito do trabalho de 20 anos foi perdido. "Tínhamos 1.250 cruzamentos e creio que perdemos 50%", avalia Norberto Silveira Jardim, gerente do viveiro. Nas estufas do jardim clonal, das casas de vegetação e de rustificação, que compõem o viveiro, a reposição de materiais destruídos custou mais US$ 360 mil. Fora isso, o gerente regional florestal, Renato Alfonso Rostirolla, calcula a perda de US$ 6 milhões pelas fibras que deixará de colher no futuro.

Os empregados (são 250) dizem que, passado o susto, recuperaram a tranqüilidade para coleta, enraizamento e preparação dos brotos para envio ao plantio. "Pensei que não seria mais possível recuperar tudo isso", admite Fernanda Brasil Vieira. Patrícia Machado recorda que foram feitas de duas a três horas extras de trabalho por dia, por uma semana, para recolocar as coisas nos lugares. Retomada a rotina, os caminhões voltaram a transportar 240 mil mudas por dia do viveiro para as plantações, espalhadas por 42 mil hectares num raio de 80 quilômetros.

A destruição, que visava a contestar a expansão do cultivo de eucaliptos, levou a denúncia do Ministério Público contra os 37 organizadores do ato, entre eles o líder do Movimento dos Sem-Terra (MST) João Pedro Stédile. A Justiça instaurou processo contra os acusados nesta semana e autorizou a quebra do sigilo bancário das associações envolvidas. Os acusados responderão por dano qualificado, furto qualificado, formação de quadrilha e bando armado, seqüestro e cárcere privado e lavagem de dinheiro.