Título: Itamaraty faz alerta à embaixada boliviana
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Fonte: O Estado de São Paulo, 09/05/2006, Economia & Negócios, p. B9

Encarregado de negócios é avisado de que governo não admitirá arbitrariedades contra brasileiros no país

O Itamaraty chamou ontem o encarregado de negócios da Embaixada da Bolívia no Brasil, Pedro Gumucio, para reiterar que o governo brasileiro não admitirá medidas arbitrárias contra brasileiros residentes no país. Gumucio foi convocado pelo embaixador Ruy Nogueira, subsecretário de Cooperação e das Comunidades Brasileiras no Exterior, que já havia dado o mesmo recado ao diplomata boliviano na sexta-feira.

Segundo o Itamaraty, está em vigor um acordo bilateral de regularização imigratória, de 2005, que facilita a naturalização dos brasileiros que vivem na Bolívia e dos cerca de 80 mil bolivianos que se estabeleceram em São Paulo. O acordo deverá ser renovado, por interesse mútuo, em setembro.

O objetivo do governo Evo Morales de realizar uma reforma agrária na Bolívia é conhecido desde a sua campanha eleitoral, no ano passado. Evo sublinhou essa meta em seu programa de governo e em seu discurso de posse, em 22 de janeiro. Mas, até o momento, a diplomacia brasileira não tem idéia clara sobre os termos do projeto de lei e dos decretos que o regulamentarão.

A preocupação do Itamaraty se concentra na situação de cerca de 150 famílias brasileiras que investiram na compra de terras no Departamento de Santa Cruz, onde se tornaram responsáveis por 40% da produção de soja do país e por 60% das exportações dessa oleaginosa. Até o momento, informou um diplomata brasileiro, nenhum desses cidadãos apresentou queixa de ausência de segurança jurídica ao Consulado do Brasil em Santa Cruz de la Sierra.

Também preocupa o Itamaraty o destino de cerca de 2 mil brasileiros que se estabeleceram como pequenos proprietários no Departamento de Pandu, ao norte do país, depois de vencidos seus contratos temporários de trabalho na colheita de castanhas. Em princípio, a situação de parte deles pode ser caracterizada como ocupação de áreas de proteção florestal. Muitos se queixaram de pressões de autoridades bolivianas.

INTERVENÇÃO O presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Mato Grosso (Famato), Homero Alves Pereira, cobrou ontem "uma intervenção urgente da política externa brasileira" em relação ao governo boliviano. Depois de nacionalizar as refinarias e poços de petróleo da Bolívia, o presidente Evo Morales agora quer expulsar os agricultores brasileiros que trabalham no país.

Segundo Pereira, o clima é de muita apreensão entre os produtores de Mato Grosso. "Muitos companheiros nossos, inclusive de Mato Grosso, investiram praticamente uma vida na Bolívia. Não é justo que, de uma hora para outra só porque mudou o presidente, eles tenham que sair, abandonar suas lavouras. Não pode haver uma expropriação."

Os produtores foram estimulados pelo governo boliviano a cruzar a fronteira na década de 90, disse Pereira. Estimativas extra-oficiais indicam que há, na Bolívia, 30 mil agricultores brasileiros. No Paraguai, o número de produtores brasileiros é bem maior: cerca de 300 mil.