Título: Nunca se gastou tanto
Autor: Ribamar Oliveira
Fonte: O Estado de São Paulo, 05/06/2006, Economia & Negócios, p. B2

Há uma sensação generalizada de que os gastos do governo Lula este ano baterão todos os recordes. Mas, até agora, ninguém tinha quantificado o crescimento programado para as despesas. As Consultorias de Orçamento da Câmara e do Senado fizeram uma primeira avaliação e encontraram um número surpreendente. Segundo o estudo das Consultorias, as despesas correntes primárias deverão aumentar 0,56% do Produto Interno Bruto (PIB). Elas passarão de 17,58% do PIB em 2005 para 18,14% do PIB este ano, como mostra a tabela abaixo.

Traduzindo: as despesas correntes passarão de R$ 340 bilhões em 2005 para cerca de R$ 381 bilhões este ano - um crescimento nominal de 12%. Isso significa que o aumento dos gastos será de cerca de R$ 41 bilhões.

Em termos reais, a ampliação das despesas ficará entre R$ 25 bilhões e R$ 27 bilhões, dependendo do índice de inflação que for utilizado no cálculo. Para manter as despesas correntes no mesmo nível do ano passado (ou seja, em 17,58% do PIB), o governo teria que realizar um corte de cerca de R$ 12 bilhões na programação atual.

É importante observar que as despesas correntes primárias não incluem os investimentos e nem os pagamentos de juros das dívidas públicas. Elas estão relacionadas com o custeio da máquina, pagamento do funcionalismo, benefícios previdenciários e com outras despesas obrigatórias, coma saúde, a educação e o seguro desemprego . Ou seja, são despesas que não desaparecerão nos próximo anos e serão muito difíceis de serem cortadas.

Inicialmente, as Consultorias da Câmara e do Senado estimaram que as despesas correntes ficariam em 18,25% do PIB, a partir da avaliação feita pelo governo sobre a execução orçamentária no primeiro bimestre deste ano e da previsão de que o contingenciamento nas dotações do Orçamento seria de R$ 14,1 bilhões. Mas o decreto de programação orçamentária e financeira, editado em maio pelo presidente Lula, reduziu a despesa com benefícios previdenciários prevista para este ano. Com isso, a estimativa para as despesas correntes passou para 18,14% do PIB.

O gasto corrente primário registrado no último ano do governo Fernando Henrique Cardoso foi equivalente a 17,1% do PIB. Assim, se a estimativa das Consultorias se confirmar, o presidente Lula terminará o seu governo com um aumento das despesas correntes em 1 ponto porcentual do PIB.

Essa expansão se deve principalmente à explosão dos gastos com benefícios previdenciários, impulsionados este ano pelo aumento de 16,6% no salário mínimo. A previsão que consta do último decreto de contingenciamento é de que as despesas previdenciárias aumentarão R$ 19,1 bilhões em comparação com 2005. Elas passarão de R$ 146 bilhões para R$ 165,1 bilhões. O déficit da Previdência Social deve aumentar R$ 5,6 bilhões este ano, passando dos R$ 37,6 bilhões registrados em 2005 para R$ 43,2 bilhões em 2006.

Todas as despesas relacionadas com o salário mínimo também crescerão muito. Os gastos com abono e seguro desemprego passarão de R$ 11,3 bilhões no ano passado para R$ 14,6 bilhões este ano - aumento de R$ 3,3 bilhões. As despesas com a Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS) passarão de R$ 7,5 bilhões em 2005 para R$ 9,9 bilhões este ano - aumento de R$ 2,4 bilhões. Os gastos com o Bolsa Família passarão de R$ 6,5 bilhões no ano passado para R$ 8,3 bilhões.

Pela primeira vez no governo Lula, as despesas com o pagamento do funcionalismo ativo e inativo terão, este ano, forte crescimento. O governo trabalha com uma despesa com pessoal e encargos de R$ 105,1 bilhões - um aumento de R$ 11,9 bilhões em comparação com os gastos de 2005. Há uma expectativa na área técnica de que esse montante poderá aumentar ainda mais se o governo ceder, ainda este mês, a todas as pressões por aumentos de salários de servidores.

Até o ano passado, o governo Lula utilizou a redução nos gastos com o pagamento do funcionalismo como uma variável do ajuste fiscal. No último ano do governo FHC, por exemplo, as despesas com pessoal e encargos equivaliam a 5,57% do PIB, de acordo com dados do Ministério do Planejamento. Elas caíram para 5,07% do PIB em 2003 e para 4,81% do PIB em 2005. Este ano, essas despesas deverão ficar um pouco acima de 5% do PIB. Mesmo assim, elas ainda serão inferiores às do último ano de FHC, em proporção do PIB.

Se a projeção das Consultorias da Câmara e do Senado se confirmar, as despesas correntes primárias deste ano ficarão 1,15% do PIB acima do limite que a equipe econômica propôs para 2006, quando encaminhou ao Congresso, em abril do ano passado, o projeto de lei de diretrizes orçamentárias. Naquela época, o governo chegou a defender um limite para as despesas corrente de 17% do PIB.

A nova regra proposta pela equipe econômica, e que consta do projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para 2007, prevê a redução das despesas correntes primárias em 0,1% do PIB ao ano. Caso a regra seja implementada, o governo levará 10 anos para reduzir essas despesas para 17% do PIB, lembram os técnicos das Consultorias de Orçamento da Câmara e do Senado. Em outras palavras, o governo levará 10 anos para alcançar um objetivo a que tinha se proposto para este ano.