Título: Meta é fazer o oposto do 1º mandato
Autor: Roberto Lameirinhas
Fonte: O Estado de São Paulo, 05/06/2006, Internacional, p. A11

Presidente que mergulhou o país na hiperinflação e estatizou sistema bancário, agora promete expansão do PIB

Depois de praticamente quebrar o país durante sua administração,de 1985 a 1990, Alan García, do Partido Aprista Peruano, volta à presidência do Peru com a promessa de criar 300 mil empregos nos próximos cinco anos, manter o crescimento do PIB em 7% anuais, assegurar a segurança jurídica do país e levar adiante o acordo de livre comércio com os EUA.

"O compromisso de García é, basicamente, de fazer o contrário de tudo o que fez em seu primeiro mandato", afirma o titular da cadeira de Ciências Políticas da Universidade Nacional de Lima, Anibal Camacho. Ele lembra que durante a primeira "era García" a hiperinflação superou 7.200%, o sistema bancário foi estatizado, o terrorismo do Sendero Luminoso minou o estado de direito e o calote na dívida externa isolou o Peru da comunidade internacional.

As propostas apresentadas por García - eclipsadas pela guerra de insultos e acusações da campanha no segundo turno - são vagas e imprecisas. Sua equipe apresentou o projeto de converter em pólos exportadores de produtos agroindustriais 23 regiões dos Andes peruanos, programa denominado Serra Exportadora. Nunca ficou claro de onde sairá o investimento para que o programa deixe o papel.

Durante o debate entre as equipes de governo das campanhas de García e de seu adversário, o nacionalista Ollanta Humala, no dia 28, os apristas também propuseram incrementar o turismo interno garantindo sete períodos de feriados prolongados por ano e oferecendo benefícios tributários para empresas que facilitarem viagens de seus empregados.

García promete ainda criar uma rede para a distribuição de medicamentos genéricos para os mais pobres, investir na educação pré-escolar e combater a corrupção.

No plano externo, além do acordo de livre comércio com os EUA, García deu indicações durante a campanha de que pretende reforçar os laços com o Brasil, do presidente Luiz Inácio Lula da Silva; do Chile, de Michelle Bachelet; e do Uruguai, de Tabaré Vásquez. Os três presidentes foram citados pelo então candidato aprista como representantes da "esquerda responsável" - uma provocação ao presidente venezuelano, Hugo Chávez.

Chávez será exatamente o principal problema da diplomacia do Peru sob a administração de García. O presidente venezuelano, que interferiu diretamente na eleição ao apoiar Humala, tem insistido que não manteria relações com um governo aprista. García qualificou Chávez de "sem-vergonha" por gritar aos quatro ventos sua retórica antiimperialista ao mesmo tempo que se mantém como um dos principais fornecedores de petróleo para os EUA.

Num inestimável favor a García, Chávez não recusou a guerra verbal e disse que García era "ladrão" e "corrupto". Os insultos se estenderam ao presidente peruano, Alejandro Toledo, considerado pelo venezuelano "traidor do povo indígena".

"Ao apostar em Humala e interferir abertamente na eleição peruana, Chávez se expôs e agora compartilha com ele uma enorme derrota política", diz o professor Camacho. "Depois da eleição do aliado Evo Morales, na Bolívia, o venezuelano amarga agora um revés em seu projeto de ampliar sua influência na região."

O esforço de García de fazer o povo esquecer o desastre em que se converteu seu primeiro governo encontrará obstáculo inicial no Congresso peruano. Nas eleições de 9 de abril, o Partido Aprista Peruano elegeu apenas 36 dos 120 congressistas. A coalizão que apoiou Humala terá 44 deputados. Para garantir alguma governabilidade, García terá de buscar apoio legislativo na Unidade Nacional, da conservadora Lourdes Flores (17 deputados) e no movimento fujimorista Aliança pelo Futuro (13).