Título: Pesquisa mapeia uso de ecstasy
Autor: Emilio Sant'Anna
Fonte: O Estado de São Paulo, 30/05/2006, Vida&, p. A17

Psicóloga da USP defende ações para reduzir danos causados pela droga que agita baladas

O projeto se chama Baladaboa. O nome com duplo sentido é sugestivo e remete a um termo conhecido dos freqüentadores das raves (festas com música eletrônica). Bala, como é chamado o ecstasy, é hoje a droga mais consumida nas baladas.

É a principal constatação da psicóloga Stella Pereira de Almeida em sua tese de doutorado, um projeto de prevenção e redução de danos desenvolvido no Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (USP) que indica um alto índice de dependência dos usuários.

Para chegar ao usuário, o meio escolhido foi a internet. No site do projeto, a pesquisadora elaborou um questionário sobre o comportamento e nível de conhecimento dos usuários sobre a droga.

De acordo com os critérios utilizados, 43,6% dos entrevistados foram considerados dependentes. Predominantemente jovens, 65,4% pertencem à classe A, mais da metade deles têm nível superior incompleto e se dizem satisfeitos com suas vidas. "Mais de 30% dos usuários estão correndo riscos, como dirigir sob efeito da droga e praticar sexo inseguro. Entre eles, 12% correm mais riscos sexuais quando usam o ecstasy."

Entre agosto de 2004 e fevereiro de 2005, 1.140 pessoas responderam às perguntas. A partir da análise dos dados, Stella identificou o perfil dos consumidores e os riscos envolvidos.

"O ecstasy é uma droga em ascensão sem nenhum dado epidemiológico confiável", diz . "A maioria é poliusuário de drogas, usam várias substâncias ao mesmo tempo ou separadamente."

'MUNDO SEM DROGAS É UTOPIA'

Apesar do perfil de consumo ser associado a jovens da classe alta, Stella destaca a expansão do uso nas periferias, onde é consumido em grupo, dividindo-se a mesma "bala" entre os usuários.

O aumento no consumo da droga pode ser medido pelo número de apreensões. "Nos últimos cinco anos as prisões relacionadas ao ecstasy aumentaram cerca de 50%", avalia Cosmo Stikovics, delegado do Departamento de Investigações sobre Narcóticos (Denarc).

Da tese de Stella nasceu um projeto de intervenção e redução de danos. Ela defende uma posição de maior realismo frente ao problema. "É possível minimizar os riscos. Sabendo disso o usuário vai decidir de uma forma mais consciente", diz. "Um mundo sem drogas é uma utopia, precisamos ser mais pragmáticos."

Durante a fase de intervenção, o projeto prevê a distribuição de panfletos para os usuários nos locais de consumo com informações sobre os riscos e dicas para minimizar seus efeitos, como consumir água e evitar o uso associado ao álcool e a outras drogas.

Outra abordagem é direcionada aos locais em que a droga é consumida, como clubes e discotecas. O projeto pretende reunir os donos das casas noturnas e discutir medidas de prevenção que podem adotar.

CONSELHO DE USUÁRIO

O estudante e DJ R.F., de 22 anos, não sabe nada sobre programas de redução de danos. Mesmo tocando em clubes e boates onde a presença do ecstasy é constante, nunca ouviu falar do assunto. R.F. é diabético e há menos de um ano, preocupado com sua saúde, parou de usar a droga.

Em busca de informações, R.F. criou uma comunidade no site de relacionamentos Orkut. Na lista de discussões do site, os participantes tiram suas dúvidas, como qual tipo de ecstasy é o melhor, ou se podem tomar mesmo tendo problemas como síndrome do pânico (como fez uma garota de Porto Alegre, desaconselhada por outros membros da comunidade).

"A maioria das pessoas usa apenas para 'pirar' e não busca informações, por isso é bom você compartilhar seu caso", diz R.F.