Título: Burocracia emperra até pesquisa básica
Autor: Lígia Formenti
Fonte: O Estado de São Paulo, 30/05/2006, Vida&, p. A16

Mesmo simples mudança de lugar de laboratório depende de autorização

Os debates mais acirrados da CTNBio quase sempre referem-se à liberação comercial de plantas transgênicas produzidas por multinacionais. Mas a pesquisa básica brasileira também sofre.

Na Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da Universidade de São Paulo (USP), cientistas do Departamento de Genética precisavam da autorização da CTNBio para importar uma dúzia de sementes geneticamente modificadas de Arabidopsis thaliana, uma planta modelo de laboratório usada no mundo inteiro. O pedido foi feito no fim do ano passado.

"Já desistimos", conforma-se o pesquisador Daniel Scherer de Moura, que coordena o projeto. Em vez disso, a equipe está tentando produzir as próprias sementes, a um custo de tempo muito maior. As que viriam dos EUA já teriam alguns genes desligados, envolvidos na síntese de um grupo de peptídeos hormonais. Os cientistas usariam as plantas modificadas para entender melhor a função de cada molécula. Tudo dentro do laboratório. "Não há nenhum uso para isso em campo, mas como as sementes são geneticamente modificadas, têm de passar pela CTNBio", explica Moura.

No Centro Nacional de Recursos Genéticos e Biotecnologia (Cenargen) da Embrapa, em Brasília, o pesquisador Eduardo Romano precisa da autorização da CTNBio para mudar de lugar o Laboratório de Biologia Molecular Vegetal. Ainda não fez o pedido, mas sabe que a espera será longa. "A coisa está péssima", disse.

O pesquisador da Embrapa e integrante da CTNBio, Edilson Paiva, lamenta o atraso na análise para liberação comercial do milho transgênico e da liberação para estudo em campo de sementes de algodão e soja modificada. "São mais de 200 projetos de liberação planejada emperrados", afirma.

"Em vez de aproveitar o desenvolvimento destas espécies em instituições públicas, o Brasil irá acabar caindo nas mãos de empresas privadas internacionais, que ditarão preço e ofertarão um produto que talvez não seja o mais apropriado às condições do País", diz Paiva.