Título: Lula põe em marcha plano para liquidar eleição já no 1º turno
Autor: Paulo Moreira Leite
Fonte: O Estado de São Paulo, 27/05/2006, Nacional, p. A4

Prioridade é conquistar PMDB, com oferta da vaga de vice, mas estratégia inclui sacrifícios para o PT nos Estados

Na mesma semana em que levantamentos do Datafolha e do Instituto Sensus indicaram a possibilidade de uma vitória de Luiz Inácio Lula da Silva no primeiro turno, o Palácio do Planalto definiu uma estratégia para tentar transformar as pesquisas de opinião em votos de verdade em 1º de outubro. Lula está convencido de que tem chances reais de liquidar a parada na primeira fase e convocou uma reunião de quatro horas, na quarta-feira, no Planalto, para discutir o assunto com o ministro de Relações Institucionais Tarso Genro, o presidente da Câmara, Aldo Rabelo, além de dirigentes do PT, do PC do B e do PSB.

Em ambiente de comemoração pelo desempenho nas pesquisas, Lula deixou claro que a aliança com o PMDB é prioridade absoluta. Num esforço para atrair a legenda, ele marcou encontro com o ex-governador Orestes Quércia para segunda-feira. Lula imagina que pode arrematar o PMDB para seu palanque se oferecer a vaga de vice-presidente, hipótese que a maioria de seus auxiliares define como sonho de uma tarde de outono. Um interlocutor do presidente garante que Lula ainda não desistiu de convidar para a vaga o ex-deputado Nelson Jobim, que deixou a presidência do Supremo Tribunal Federal dizendo que não iria concorrer a nenhum cargo executivo nas eleições de 2006.

A idéia do Planalto é montar uma dezena de palanques fortíssimos em Estados de grande poder de fogo eleitoral. O governo calcula que a parada decisiva será jogada nas próximas semanas, quando ocorrem as convenções partidárias. Nos próximos dias, Tarso e o presidente do PT, Ricardo Berzoini, além do próprio Lula, estarão mobilizados para entrar em negociações de bastidor para definir quem será quem na campanha.

Tarso e Lula devem manter conversas externas. Já Berzoini recebeu a incumbência de levar uma discussão interna no PT, tarefa que pode se revelar traumática. Em nome da reeleição, diversos candidatos do PT devem ser convencidos a arquivar a própria campanha para apoiar aliados. Há dificuldades previsíveis. O PC do B quer disputar o Distrito Federal com o ex-ministro dos Esportes Agnelo Queiroz. Ocorre que os petistas já lançaram Arlete Sampaio, líder reconhecida da legenda. Em Santa Catarina e Paraná, o Planalto considera que é prioridade apoiar os palanques de Luiz Henrique e Roberto Requião. O argumento em defesa de uma operação que já deu errado em outras eleições segue a linha do sacrifício particular em nome de um bem maior.

MERCADANTE

O esforço federal pelo primeiro turno pode prejudicar a campanha do senador Aloizio Mercadante ao governo de São Paulo. O Planalto quer polarizar a campanha paulista entre Mercadante e José Serra, esvaziando outros concorrentes, o que beneficia o candidato do PSDB, em melhor posição nas pesquisas. Já o senador, que precisa impedir uma decisão no primeiro turno, tem interesse em estimular outras candidaturas. "Lula sempre defendeu Mercadante, mas agora as estratégias são diferentes", explica um dos articuladores do Planalto.

O encontro de quarta-feira teve momentos descontraídos. "Depois de tudo o que enfrentou, Lula virou aquele sujeito de bem com a vida, que sabe que Deus existe e gosta dele", resume um dos presentes, bem-humorado. Houve tempo até para comentários rápidos sobre um eventual segundo mandato. Quando um dos presentes disse que era preciso cuidar para não se repetirem os "erros do primeiro mandato", ninguém achou necessário pedir explicações.

Ainda que todos acreditem que Geraldo Alckmin pode se aproximar dos 35% de intenções de voto até a reta final, não faltaram observações irônicas sobre as dificuldades tucanas. Os presentes também festejaram o canibalismo entre PSDB e PFL. Um dos aliados do Planalto foi embora convencido de que, ao manifestar solidariedade ao governador Cláudio Lembo depois da onda de violência em São Paulo na semana passada, Lula ensaiou um lance maquiavélico, cultivando uma atitude de neutralidade benevolente do Palácio dos Bandeirantes ao longo da campanha, o que seria de grande utilidade para sua reeleição.

Em 2002, o PT tentou levar o pleito no primeiro turno, também. O plano não deu certo e teve um efeito daninho: arrombou o caixa do partido, que ficou sem dinheiro para enfrentar a segunda fase - situação que abriu espaço para as andanças não-contabilizadas do tesoureiro Delúbio Soares.