Título: García quer acordo para governar
Autor: Roberto Lameirinhas, LIMA
Fonte: O Estado de São Paulo, 06/06/2006, Internacional, p. A11

Presidente eleito terá de negociar com oposição para conquistar maioria de cadeiras no Congresso

O retorno de Alan García à presidência do Peru, 16 anos depois do fim de seu desastroso primeiro mandato, abre o "terceiro turno" das eleições peruanas, segundo o jornalista e analista político Mirko Lauer, um dos mais conhecidos do país. Na visão de Lauer, a vitória de García e as circunstâncias da campanha - na qual protagonizou um duro conflito verbal com o presidente venezuelano, Hugo Chávez - devem empurrar o próximo governo a uma aproximação pragmática na direção de Brasil, Chile e EUA. Num sinal disso, ele aceitou o convite feito ontem por telefone pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva para visitar o Brasil antes da posse, em julho, segundo o Planalto. Mas será no plano interno que García encontrará as maiores dificuldades.

"García sabe que os votos que o levaram à vitória não são votos de seu Partido Aprista Peruano", diz Lauer. "E sabe também que, com apenas 36 congressistas eleitos, terá de ceder grandes fatias de poder para forças que sempre foram contrárias aos apristas", como a coalizão Unidade Nacional, que conquistou 17 cadeiras no Congresso e apoiou no primeiro turno a candidata presidencial conservadora Lourdes Flores. Ou terá ainda de recorrer à bancada fujimorista, que elegeu 13 deputados. Para a quase totalidade dos analistas peruanos, García não terá um período de lua-de-mel com o eleitorado nos primeiros meses de seu governo. Os votos genuinamente apristas não passam de 25%.

Os líderes do partido de García apostam que conseguirão um acordo de governabilidade com a maior bancada do Congresso, obtida pelo partido de Ollanta Humala, a União pelo Peru, que elegeu 45 deputados. Mas por enquanto é difícil ver essa aproximação. O discurso de Humala após a divulgação dos primeiros resultados do segundo turno, ainda no domingo, não dá margem a muito otimismo quanto a isso. A situação do ex-presidente Alberto Fujimori, em liberdade condicional no Chile, é outro problema que deverá ser resolvido no próximo governo. A Justiça chilena analisa o pedido de extradição feito pelo Peru com base em oito acusações contra Fujimori.

"Estamos diante de uma das ironias comuns à política", disse ao Estado o professor de Ciências Sociais da Universidade San Martín de Porres, Julio Galvéz. "Depois do autogolpe de Fujimori, em 1992, García foi obrigado a deixar o país, enquanto o governo tentava obter sua extradição para que respondesse por acusações de corrupção. Agora a situação é exatamente a inversa."